terça-feira, 5 de junho de 2018

Disco da Semana - Silva (Brasileiro)

Ainda que a opção pela MPB em seu estado mais puro possa representar uma escolha bastante cômoda na carreira do capixaba Silva, parece ser inegável a sua capacidade não apenas de se reinventar - ainda que em um gênero tão consolidado - mas também de se adaptar bem a qualquer estilo. Se nos dois primeiros registros - Claridão (2012) e Vista Pro Mar (2014) - parecia ser inescapável uma empolgação juvenil que se manifestava por meio de sintetizadores ensolarados e versos primaveris (tão saborosos quanto o final de tarde entre amigos na beira da praia), a partir de Júpiter (2015), o que se convencionou com a adoção de uma eletrônica mais intimista foi o velho refrão que diz que "menos é mais". Silva passou a ser mais direto nos versos sobre o amor - tão caros a qualquer um de nós. E, como numa espécie de contraponto, passou a uma abordagem mais discreta, quase tímida - o que aumentou ainda mais o amor dos fãs por ele.

Agora, com Brasileiro, o artista parece prosseguir com esta proposta - a de tocar o coração do ouvinte, mas com sutileza, com carinho, sem exagero. Partindo das beiradas para chegar no centro, assim como fazemos quando deixamos a melhor parte da nossa refeição para o final. Nesse sentido, o registro se apresenta como uma extensão quase natural do material apresentado nas recentes edições de Silva Canta Marisa (2016) e Silva Canta Marisa Ao Vivo (2017). Ainda assim, é preciso que se diga, Silva se apropria de tudo aquilo que existe de melhor na MPB (e também na bossa nova, do samba e de outras vertentes), mas sem deixar de imprimir a sua personalidade a cada uma das composições. “Acho que o disco reflete a forma como eu me enxergo no mundo, e também a maneira como hoje me enxergo brasileiro, profundamente ancorado na esperança do que surgirá de bom de todo esse caos em que vivemos", explica o artista no material de divulgação, como forma de justificar tanto "brasileirismo" em um só trabalho.



Talvez não seja por acaso o fato de o primeiro single, a grudentíssima Fica Tudo Bem, contar com a participação da cantora Anitta, afinal de contas nada mais brasileiro e contemporâneo do que a fusão entre artistas de vertentes tão distintas como o pop, o funk e a eletrônica. Como ocorre na maior parte do registro, a canção de versos delicados, mergulha descaradamente no romantismo confessional provocando a identificação imediata do ouvinte - Amigo, amar alguém a fundo / É coisa séria de querer (de querer) / Cuide de quem te quer e cuide de você (Cuide de você). O expediente se repete em muitas outras canções, casos de A Cor É Rosa (E sempre que eu pensar no meu bem / Vou colorir o dia), Ela Voa (Quem tentar entender o amor / Corre o risco de enlouquecer / O amor não tem solução, é só viver, é só viver) ou Duas da Tarde (Vem cá / Pra fora da cama / São duas da tarde / Vou ali ver o mar). Tudo emoldurado por um clima agradável, de romance febril (e gostoso), daqueles que a gente deseja que nunca termine.

Ainda que, declaradamente, o cantor não tivesse a ambição de transformar o registro em um painel político, assim como fazem tantos outros artistas, a discussão acaba sempre surgindo, aqui e ali, como no caso da inaugural Nada Será Mais Como Era Antes (que tem um poema de Gonçalves Dias como base para a letra) ou Milhões de Vozes (que não deixa de demonstrar certo desalento com a ignorância que se desnuda todos os dias, especialmente nas redes sociais). Ainda assim, entre batidas eletrônicas minimalistas, percussão bem pontuada, corais de vozes, lalaiás e outros efeitos, Silva quer mesmo é falar de amor. E o faz dialogando com nomes tão distintos como Caetano Veloso (Let Me Say), Chico Buarque (Prova dos Nove) e João Gilberto (Duas Tarde). Ouvi dizer / Que é lugar bem bom pra se morar / Quem mora lá / Não quer nem viajar, encerra Silva na derradeira Brasil, Brasil. Nesse País tão bonito cantado pelo capixaba, de fato, não há vontade de sair.

Nota: 8,8

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