segunda-feira, 18 de junho de 2018

Lado B Classe A - Muse (Black Holes and Revelations)

É muito provável que poucas bandas sejam tão "ame ou odeie" como o Muse. Quem gosta, costuma destacar o virtuosismo do grupo, o seu esforço em soar grandiloquente e pop ao mesmo tempo, sem esquecer do clima retrô/futurista que rege as composições. Quem não gosta, acha Matthew Bellamy um vocalista exagerado e a banda cheia de afetações, com sintetizadores excessivos (e repetitivos) e aquele clima rock de arena farofa capaz de irritar qualquer ouvinte do novo milênio. Para o bem ou para o mal, é um grupo que costuma chamar a atenção - sendo cada novo lançamento aguardado para ser louvado e atacado em igual medida. Aqui no Picanha nosso sentimento é curiosamente misto, já que não morremos de amores pelo quarteto. Mas há bons álbuns, casos de Origin Of Simmetry (2001) e Absolution (2003). Só que o disco que, até hoje, permanece inabalado no coração dos fãs, é o irretocável Black Holes and Revelations, de 2006.

Poucas vezes na história os ingleses parecem ter alcançado tamanha uniformidade em um registro - ainda que cada composição funcione surpreendentemente de maneira isolada. Com aparente consciência daquilo que representa em termos de personalidade no universo musical, Bellamy e companhia parecem se deleitar ao flertar com os mais variados estilos - da eletrônica "alienígena" ao pop radiofônico, passando ainda pelo rock progressivo. Canções como Starlight, por exemplo, não fariam feio em algum registro que compilasse as melhores canções dos anos 80 - ainda que o refrão (aliás, são dois refrões) represente o tipo de "explosão" típica que acompanharia o grupo por toda a carreira. Já Supermassive Black Hole, cantada por Bellamy em falsete, mais parece extraída de algum registro perdido do Prince, ainda no milênio passado (e não poderia haver melhor elogio do que esse, vamos combinar).



Outra canção que chama a atenção é Knights Of Cydonia - que mais parece saída de um daqueles antigos jogos de RPG e que determina o momento exato em que os aventureiros encontram o seu maior vilão - e a sonoridade, que lembra uma espécie de cavalaria se aproximando do espaço sideral, contribui para esse clima. Já Invincible talvez seja uma das mais doces e belas baladas já feitas pela banda - e talvez uma das únicas. Afeito desde sempre aos temas políticos, o Muse utiliza o registro também como um veículo para a crítica social a sistemas opressores e como comentário para uma sociedade tecnológica, fria, individualista e vigiada pelos governos - tipo de estratagema que se ampliaria até a chegada de Drones (2015), mais recente trabalho. Map Of The Problematique fala de maneira escancarada sobre o sentimento de isolamento (A solidão vai acabar / Quando essa solidão vai acabar?). Já Exo-Politics versa sobre teorias da conspiração, em meio a uma sociedade que permanece alienada e letárgica diante de tudo (Enquanto conspirações se espalham / Você irá fechar ou abrir sua mente / Ou permanecer hipnotizado?).

Ainda relativamente longe da pretensão que transformaria a banda quase em uma caricatura dela mesma, anos mais tarde, Black Holes and Revelations ainda é o tipo de disco que envelhece bem e é capaz de traduzir - talvez numa espécie de combo com o multipremiado (e já citado) Absolution (2003) - qual a verdadeira personalidade do grupo. Se aqui e ali, é possível perceber influências de artistas distintos como Queen, Depeche Mode, Radiohead ou o já citado Prince, isto também parece se dar pelo fato de Bellamy. o baixista Chris Wostenholme e o baterista Dominic Howard estarem menos preocupados com o hype. Espontâneo e excêntrico na mesma medida, dançante e cheio de guitarras enérgicas que nos fazem ir do velho oeste ao apocalipse em um piscar de olhos, o registro recebeu uma infinidade de críticas positivas - o semanário New Musical Express deu nota 9 (de 10) e a revista Q o avaliou com cinco estrelas. Já aqui no Picanha, não poderia ser diferente, já que o trabalho é um verdadeiro Lado B Classe A.

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