terça-feira, 23 de agosto de 2016

Picanha.doc - The Human Experiment

De: Dana Nachmann. Narração: Sean Penn, 2013, 92 minutos.

Beber, fumar, comer açúcar e gordura em excesso. Saltar de paraquedas, surfar uma onda enorme, fazer base jumping, torcer para o Grêmio. Todas essas ações demasiado humanas possuem aquilo que podemos chamar de "risco calculado" - espécie de trato que fazemos com o nosso destino. É óbvio que sabemos que podemos morrer saltando de paraquedas, caso o equipamento não funcione. Se fumarmos duas carteiras de cigarros por dia, bom, talvez tenhamos câncer de pulmão. Diabetes, insuficiência cardíaca, cirrose. Todas são doenças que podem ser desencadeadas pelos nossos hábitos alimentares, tendo nós a consciência e - pode-se dizer - um certo domínio das atitudes. Mas e quando os riscos a que estamos submetidos são escondidos por empresas - multinacionais, como não poderia deixar de ser - preocupadas somente com o lucro final? Empresas que nos forçam a nos contaminarmos - e a nossos filhos - com produtos perigosos para a nossa saúde todos os dias? É esse o tema do arrebatador documentário The Human Experiment, disponível na Netflix.

Desde 1975 as taxas de incidência de câncer de mama subiram mais de 30% em mulheres e também em homens, afetando inclusive jovens que nunca beberam, que não têm histórico familiar da doença, que não comem carne vermelha e ainda praticam exercícios. Mas de onde vem isso? O que o filme de Dana Nachmann tenta fazer - com sucesso, diga-se - é relacionar esses números estarrecedores com outros, como aquele que dá conta do elevado número de produtos químicos existentes hoje em dia, e que podem estar em qualquer lugar - nos nossos cosméticos, na garrafa plástica de água e até mesmo no sofá que a gente senta. Se no início daquilo que se conhece como Revolução Química Moderna, nos anos 60, havia cerca de 80 mil produtos químicos, hoje, esse número subiu inacreditáveis 2000%. Grande parte deles sem nenhuma regulamentação porque (pasme), nos Estados Unidos não são necessárias pesquisas prévias que possam alertar para riscos à saúde humana antes de algum produto chegar ao mercado - e quando estes eventualmente aparecem, o trabalho de lobistas com bolsos recheados por milhões de dólares é o de manipular a opinião pública, apelando para artimanhas relacionadas ao benefício da dúvida, ou mesmo ao patético argumento de "não te obriguei a usar".



É claro que os casos de câncer, sozinhos, talvez não fizessem verão. Mas são tantos os números absurdos relacionados ao aumento de casos de autismo em crianças, de mulheres com problemas para engravidar (ou na gestação), de elevação de episódios de asma em adolescentes ou mesmo de más formações genitais em meninos que parece ser praticamente impossível não relacionar esse mal moderno, ao excesso de formaldeídos, de cádmio, de arsênico, de cloreto de vinil, de chumbo e de outros milhares de produtos químicos existentes em nossas vidas. E que movimentam um mercado de inacreditáveis US$ 720 bilhões ao ano - tendo por trás fabricantes como Basf, Dow, Du Pont, Exxon Mobil e, claro, como não poderia deixar de ser, a Monsanto. Pesquisadores, representantes de organizações não governamentais, ativistas, senadores, professores, médicos e jornalistas são entrevistados nesse entristecedor documentário, que mostra que bebês americanos já nascem com mais de duas dezenas de produtos químicos em seus frágeis corpos - situação que talvez venha a comprometer as suas existências.

E o mais desolador é perceber o fato de não parecer haver, salvo algumas raras exceções, o mínimo de vontade política para que esse cenário seja modificado, com senadores, deputados e governantes deixando de votar em leis importantes para a saúde da população, apenas para agradar aqueles que injetam milhões em suas campanhas. (e nesse sentido é praticamente impossível não pensar no caso de Brasil, em que um deputado propõe que o termo agrotóxico seja substituído por "produto fitossanitário" nas embalagens - perpetuando a lógica já pré-estabelecida do veneno sendo encarado como um "defensivo agrícola". Isto, enquanto milhares de produtores rurais morrem ou enfrentam severos problemas de saúde por conta do manejo inadequado ou excessivo lavouras afora) Lembra do caso do amianto? Hoje ele não é permitido mais, na fabricação de telhas. Mas foi, durante muitos anos. E não fosse o ativismo, a luta, a BRIGA talvez o cenário permanecesse o mesmo.


Pra não dizer que a multipremiada obra - recheada de ótimas imagens, infográficos interessantes e entrevistas de impacto - mostra apenas o lado ruim, na última parte da película são mostradas diversas iniciativas de indústrias que trabalham com materiais mais limpos ou menos prejudiciais. E, o mais incrível - e natural, evidentemente -, as pessoas não se importam de pagar um pouco a mais, desde que saibam que haja zelo pelas suas vidas - e aqui vale a lógica da feira de produtos orgânicos, onde pagamos 50% a mais pela bandeja de morango, com gosto. Butane, isobutane, propane, aluminum clorohydrate, PPG-14 butyl ether, cyclomethicone. disteardimonium hectorite, C12-15 alkyl benzoate, BHT, dimethiconol, propylene carbonate, citronellol, coumarin.... esses são alguns ingredientes do desodorante que eu uso - tudo em english, pra não ter pra quem chorar. Sério, acho melhor não pesquisar os efeitos de cada um desses produtos no nosso corpo. Ou começar a procurar alternativas mais sustentáveis mesmo. Alguém aí conhece algum desodorante natural?

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