segunda-feira, 20 de junho de 2016

Cine Baú - O Gabinete do Doutor Caligari (Das Cabinet des Dr. Caligari)

De: Robert Wiene. Com Werner Krauss, Conrad Veidt, Friedrich Feher e Lil Dagover. Drama / Suspense / Fantasia, Alemanha, 1920, 77 minutos.

Temas sombrios de suspense e mistério, ambientes urbanos recheados de figuras caricatas, bizarras e assustadoras, imagens e cenários distorcidos, maquiagem intensa e pesada, cenografia fantástica funcionando quase como um delírio sobrenatural ou uma espécie de sonho gótico. São tantas as características que marcam a escola cinematográfica conhecida como Expressionismo Alemão - uma das primeiras do cinema, surgida ainda no início do século passado -, que elas mal conseguem dar conta de sua riqueza enquanto estilo. Quando se analisa esta vertente, é praticamente impossível não pensar no clássico Nosferatu, lançado em 1922 pelo diretor F.W. Murnau. Ou mesmo em Metrópolis, filmado por Fritz Lang, em 1927. Mas como obra inaugural do expressionismo alemão, nenhuma delas é mais significativa do que imperdível O Gabinete do Doutor Caligari (Das Cabinet des Dr. Caligari).

Assim como ocorreria mais tarde com os igualmente marcantes Roma Cidade Aberta (1945), de Roberto Rossellini, e Os Incompreendidos (1959), de François Truffaut - que apresentariam ao mundo, respectivamente, o Neorrealismo Italiano a Nouvelle Vague Francesa -, O Gabinete do Doutor Caligari, com a sua coleção de personagens excêntricos, cenários absolutamente extravagantes e narrativa caótica (ainda que engenhosa), seria a primeira obra a explorar os elementos fílmicos que simbolizariam o cinema alemão durante toda a década seguinte. Em uma época em que o cinema - com seus pouco mais de 20 anos de vida - ainda engatinhava e filmes "ultrarrealistas" e melodramáticos como O Nascimento de Uma Nação (1915) e Intolerância (1916) - ambos de D.W. Griffith - eram a "bola da vez", um cinema expressivo e delirante, certamente representava um importante ponto de ruptura.



Certamente não é por acaso que a loucura - como bem ilustra o sanatório comandado pelo doutor Caligari do título - é parte onipresente da trama, o que possibilitou a seus roteiristas - Hans Janowitz e Carl Meyer - e a seus cenógrafos brincarem com toda a sorte de imagens geométricas, entortadas, distorcidas e teatrais, com figuras levemente grotescas, sombras assustadoras ou mesmo com estradas sinuosas e cidades que mais parecem saídas de uma graphic novel estilosa de outrora - caso esse produto já existisse para o consumo das massas. A propósito das influências, quem já assistiu ao videoclipe para a canção Otherside do Red Hot Chili Peppers ou mesmo qualquer filme do Tim Burton, sabe exatamente de onde vem a fonte de inspiração para as casas tortas, o clima soturno e a caracterização teatral.

A histeria tem propósito, já que a narrativa é contada por dois internos do sanatório que, em formato de flashback, resgatam a história do hipnotizador Caligari (Krauss), que utiliza as habilidades de seu ajudante - o sonâmbulo zumbificado Cesare (Veidt) - para prever o futuro das pessoas que participam de seus números pantomimeiros. Quando um dos homens tem a sua morte prevista já para o dia seguinte, Francis (Feher) passa a desconfiar que, tanto Caligari como Cesare, possam estar envolvidos em uma onda de assassinatos que movimentam a fictícia cidade de Holstenwall. Somente na sequência final, em uma cena reveladora é que saberemos que a verdade - ou aquilo que pensávamos ser a verdade - era bem diferente daquilo que assistíamos. Uma história intrigante e criativa, que mantem o impacto até os dias de hoje, quase 100 anos após seu lançamento.
 

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