De: David Fincher. Com Michael Fassbender, Sophie Charlotte, Tilda Swinton e Charles Parnell. Suspense / Drama, EUA, 2023, 118 minutos.
Tirada de uma série em quadrinhos, a premissa de O Assassino (The Killer) é muito boa: e se as coisas dessem muito errado para um matador de aluguel que, na hora de cumprir a sua missão, simplesmente errasse o seu alvo? Esse é o ponto de partida para a nova produção dirigida por David Fincher (Mank, 2020), que acaba de estrear na Netflix. E por mais que esse seja um thriller de um sujeito em fuga, que precisa confrontar os seus algozes, é preciso que se diga que este é um filme muito mais contemplativo e filosófico, do que poderia supor o seu resumo. Aqui, Fincher não está interessado em grandes reviravoltas, em acontecimentos turbulentos ou em câmera desenfreada. Aliás, esse é um aspecto que tem decepcionado alguns espectadores: a coisa toda tá muito mais pra Soldado Anônimo (2005) do que pra 1917 (2019) - pra ficar em dois filmes de guerra dirigidos por Sam Mendes, com propostas bem distintas.
A obra, aliás, já inicia em seu preâmbulo com uma espécie de aviso a quem a acompanha: para ser um profissional que "trabalha" matando pessoas há que se ter paciência. "É incrível como pode ser fisicamente cansativo não fazer nada. Se você é incapaz de suportar o tédio, essa ocupação não é pra você", comentará a narração em off que se arrastará por minutos a fio - quase tornando insuportável o estilo petulante do protagonista (vivido por Michael Fassbender). Claro que não demorará para que percebamos que as divagações do sujeito não passam de meras abstrações, enquanto, instalado em um quarto no topo de um prédio, aguarda o passar das horas (e o consequente instante em que seu alvo surgirá diante de sua mira). E eu não vou negar que meio que me irritei ao ver essa figura torpe tendo digressões sobre a forma como Paris amanhece, sobre quantas pessoas visitam o McDonalds diariamente ou a respeito do número de pessoas nascem ou morrem por segundo, entre outras distrações.
Há, aqui e ali, certo abuso dessas narrações em off - ainda que a gente acompanhe apenas esse sujeito praticamente o tempo todo (e tudo aquilo que está em sua cabeça). E se há um mérito no filme é justamente essa inversão de expectativas, por estarmos do outro lado da equação que seria a mais lógica dentro de um filme de perseguição policial, onde seria mais convencional acompanhar o trabalho de detetives, investigadores e policiais que, porventura, estivessem em busca de um eventual assassino. Aqui o sujeito erra o tiro na arrancada - acerta uma jovem mulher que não sabemos nem direito quem é -, já tendo que se confrontar, apenas um dia depois, com as duras consequências de seu equívoco: o que envolve a violência sofrida por sua esposa (a brasileira Sophie Charlotte) como forma de retaliação, na propriedade do casal em Santo Domingo. Ela até não morre, mas por pouco. E o matador promete a si próprio, a ela e ao irmão da vítima, caçar os executores.
Meticuloso, a sua ideia será sempre se antecipar aos seus carrascos. No submundo, acessará pessoas, arquivos e locais que possam levar à identidade de seus contratantes - naturalmente mantida em sigilo. O erro, afinal, pode representar um problema pra todos ali. Sendo complicado resolver a coisa toda sem uma dose extra de violência - sempre a sangue frio. Com fones de ouvido inseparáveis, que tocarão uma coletânea de músicas dos Smiths - algo que não chega a ser tão incongruente, dadas as novas "posturas" de Morissey no que diz respeito a certos assuntos -, o sujeito saltará da República Dominicana para Nova Orleans, Flórida, Nova York e Chicago, sempre mudando sua identidade, seu figurino, sua aparência e até a sua personalidade, naquele ideal de se manter nas sombras. Nesse sentido, o filme como um todo pode ser meio cansativo ao juntar fotografia soturna, silêncios esticados e itinerários contínuos. Ainda assim o projeto é engenhoso e se permite alguma tensão - especialmente no terço final.
Nota: 8,0
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