quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Novidades no Now/VOD - A Assistente (The Assistant)

De: Kitty Green. Com Julia Garner, Makenzie Leigh, Kristine Froseth e Matthew Macfayden. Drama, EUA, 2019, 87 minutos.

Não chega a ser exatamente uma novidade o fato de que o ambiente de trabalho, especialmente para as mulheres mais jovens, pode ser bastante tóxico. Não bastassem os variados tipos de assédio, o machismo e a misoginia, muitas mulheres também convivem com jornadas exaustivas, esgotamento mental, desvios de função e insegurança a respeito do futuro. É um combo que, invariavelmente, ataca a saúde mental, gerando ansiedade, depressão e síndromes como a de Burnout. E, em muitos casos, o assédio em si não chega a ser escancarado, ostensivo. Ele surge nos pequenos detalhes do dia a dia, no acúmulo de situações desgastantes, na sensação de fracasso iminente. Em uma cena do ótimo A Assistente (The Assistant), filme disponível na plataforma de streaming da Amazon, por exemplo, a jovem protagonista Jane (a sempre competente Julia Garner) se confunde na hora de pedir o sabor de sanduíche para um colega de sala. É o suficiente para ouvir contra si uma reação exagerada, pouco amistosa, agressiva. Afinal de contas, hoje em dia parece ser moda ser reativo, intolerante. Ou mal educado mesmo.

Na trama dessa pequena joia que versa, como já falamos, sobre a toxicidade de escritórios mundo afora, acompanhamos um dia inteiro na vida de Jane em um escritório de uma produtora de cinema. "Primeira a chegar e última a sair" como lembra um de seus chefes em certa altura - e é isso mesmo, já que a obra da diretora Kitty Green inicia com a jovem saindo de casa ainda de madrugada, para sair quase ao final da noite do dia seguinte. Em meio a atividades prosaicas da rotina do trabalho - realizar fotocópias, agendar reuniões, distribuir documentos e até fazer pequenas faxinas -, o dia vai se descortinando de forma melancólica, em meio a refeições mal feitas, ligações telefônicas pouco amigáveis e conversas de corredor sobre temas nem tão importantes assim. Em meio a todo o "caos organizado", Jane estranhará a chegada de outra jovem com idade próxima a sua, que pretende uma vaga de assistente - e que marcará uma misteriosa reunião na casa de um dos supervisores.

Como se fosse a personagem de James Stewart em Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcok, Jane terá a impressão de ter se deparado, lá pelas tantas, com um crime. E se no caso da obra-prima do Mestre do Suspense o que o protagonista via era um provável assassinato, aqui a jovem aspirante ao cargo de produtora junta os pontos que lhe levam a conclusão de que ela possa estar se deparando com um caso de assédio sexual a uma colega. E será na tentativa de denunciar esse caso, que ela perceberá a barreira infinita que existe entre ela - uma menina de seus 20 e poucos anos em início de carreira profissional -, e os magnatas da companhia, todos homens brancos, héteros, ricos, casados, machistas e sem nenhum pudor em agir como agem. Chantageando-a, ameaçando-a, a farão lembrar que, para a vaga dela, - essa legítima "vaga arrombada", por sinal - existem pelo menos 400 pessoas na fila, dispostas a ocupar esse cargo. Um cargo, não custa lembrar, de jornada exasperante e um provável salário de fome.

Porque infelizmente o que vivemos, especialmente no Brasil (nos Estados Unidos também tem ocorrido), é um cenário de completa precarização do trabalho, com perdas de direitos, revisões de leis sob a desculpa de uma suposta "modernização" e a informalidade que fragiliza, que desgasta as pessoas. E que faz com que elas se submetam, como Jane, a um ambiente de opressão, tão sufocante quanto os corredores apertados da produtora em que ela trabalha. Aliás, não é demais salientar que o desenho de produção se ocupa em tornar as salas fechadas, os cubículos que Jane percorre - com seus tons amadeirados e escuros -, em ambientes claustrofóbicos, sorumbáticos. A gente quase sufoca junto com a protagonista, tanto que quando ela sai para tomar um ar e comer um bolinho quase ao final do dia, no único momento das últimas 24 horas que ela olha para si, com alguma qualidade de vida, a gente sente um certo alívio. Que vem seguido de uma tristeza, quando percebemos que amanhã o dia segue. Provavelmente como se nada houvesse acontecido.

Nota: 8,0

Nenhum comentário:

Postar um comentário