Filme propositalmente denso, arrastado, lento, cheio de silêncios e de sutilezas, Hannah (Hannah) é o tipo de obra que testa a paciência do espectador até o limite - mas que certamente compensa aqueles que se "aventuram" por ela. Película nada fácil de ser degustada tem, de quebra, uma temática absolutamente dolorosa: a da solidão na terceira idade. Ou mesmo a sensação de isolamento neste período da vida - ainda que haja "companhias". A narrativa nos apresenta à Hannah do título (Charlote Rampling, em papel que lhe deu o prêmio de atriz, no último Festival de Veneza). Aos 72 anos, Hannah mora sozinha em um apartamento recebendo, eventualmente, a visita de seu marido - que está preso em circunstâncias que só ficarão mais claras no decorrer da projeção. Ou ficarão "claras" em partes - um dos grandes charmes da obra, diga-se.
Como forma de afastar o tédio em sua repetitiva rotina, Hannah trabalha como faxineira na casa de uma vizinha, participa de uma espécie de "grupo de apoio" (em que também ocorrem aulas de teatro e de desinibição) e, ocasionalmente, pratica natação em um clube da cidade. Em todas estas situações, a protagonista está acompanhada de outras pessoas, desconhecidas. Mas, como já dizia o filósofo Hermógenes "a pior solidão é aquela que se sente quando se está acompanhado". Nesse sentido, a única companhia real da idosa é o seu cachorro que, a bem da verdade, parece tão infeliz quanto ela. Hannah está sozinha. E se sente muito sozinha. As (poucas) tentativas de aproximação com o filho se mostrarão inócuas, já que ele prefere que a mãe mantenha distância. Condição que adicionará um componente dramático a trama. Além de aumentar a nossa curiosidade em relação aos segredos do passado, guardados por esta família.
Na intenção de tornar a experiência ainda mais sufocante, o diretor Andrea Pallaoro aposta na força do olhar e nos gestos (quase sempre contidos), como forma de manifestar sentimentos - o que Rampling faz de forma soberba, diga-se. Como numa espécie de contraponto a uma obra quase sem diálogos, os únicos momentos em que as pessoas conversam são os que envolvem as encenações para uma suposta peça de teatro ou mesmo em discussões envolvendo terceiros (como na sequência em que um casal briga dentro do metrô). Assim como os contratos sociais que nos obrigam a nos comportar desta ou daquela maneira, ou mesmo a fingir situações, também a obra parece, em alguns momentos, como uma grande encenação em que acompanhamos a vida de uma senhora devastada por anos de sofrimentos. E que tenta, ao menos de forma aparente, suportar isso. Ainda que, internamente, esteja calejada de forma quase definitiva.
Hábil em utilizar o poder da imagem como forma de sugerir ideias ou pensamentos, o diretor abusa de enquadramentos oblíquos que, captando apenas uma parte do corpo de Hannah (ou apenas a metade deste) reforçam a sua sensação de "vida pela metade" ou de "incompletude". Da mesma forma, a fotografia sempre acinzentada e os figurinos sombrios, funcionam como a metáfora perfeita para evocar a tristeza permanente da protagonista - qualquer que seja a atividade que esta realiza. Também a grande quantidade de espelhos e janelas que mostram o reflexo da idosa, parecem reforçar o fato de que, em meio a multidão, ela é apenas mais uma mulher de rosto triste, expressão melancólica, com uma vida que não diz respeito a mais ninguém. Afinal de contas, em um mundo tão individualista como o que vivemos, é assim que somos e pouco nos importamos com as angústias, sofrimentos ou anseios dos outros. "Uma velha de 72 anos? Que viva a sua pobre vida sem atrapalhar os outros."
Nota: 8,5
Filme desafiador e hipnótico.
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