Houve um tempo em que tínhamos o que lutar - sonhos fictícios ou idealizados, vida pulsante, insegura, trêmula, palpável. Que o piegas não nos envergonhava, que nos odiávamos menos, orgulhávamos pouco. Que achávamos legal aquela música em inglês que nos dizia coisas que traduzidas fariam corar o maior dos sertanejos, mas era bacana pois estava disfarçada através de tatuagens, jaquetas de couro, guitarras Gibson e amplificadores Marshall. Até os brutos amam, amam ser brutos pra negar que assim os são: seres amantes e destinados à "sofrência" que mais cedo ou mais tarde virá, coisa sabida assim de longe por qualquer um. Houve um tempo em que sonhávamos com liberdade, em sentir o vento bater no rosto em uma estrada sem fim, mas não podíamos. Hoje podemos, mas não sabemos o que fazer. De luvas e capacete fugimos, o motor vibrante sincroniza os batimentos e a respiração - pensamos ser livres.
Haverá um dia em que as coisas serão vistas de forma diferente. Nosso olhar muda a cada instante - às vezes não, talvez nunca mude ou nem dê tempo pra isso. Que aprenderemos algo novo, retornaremos àquela sensação de subir no palco pelas primeiras vezes, a comunhão em ser visto, identificado, tocar alguém de forma que faça sentido. Que ligaremos o rádio e estará tocando Bruce Springsteen, "The Boss", com aquele seu jeitão grandioso, como se aquela canção fosse seu último testamento em vida - e ela pode se esvair a qualquer momento. Talvez essa estação de rádio seja muito anacrônica e nem exista mais. Talvez a modernidade seja a salvação, e no seu mp3 player esteja tocando Get Hurt (2014), dos americanos do The Gaslight Anthem, uma atualização para os tempos remotos de sentimentos esquecidos.
Sobre o disco? Não há muito o que dizer, nem sempre há o que dizer. Que em alguns momentos o timbre do vocalista Brian Fallon lembre o do vocalista do The National é uma baita surpresa (e referência). Que é música tocada com paixão, garra, nos maiores moldes do rock americano de raiz, com guitarras no talo e vocais apaixonados não é preciso nem falar. Que nos traz de volta toda a nostalgia e vontade de percorrer novamente uma estrada sem saber onde vamos parar, já é uma obviedade. Que eu não vá procurar traduzir as letras 'nem a pau' é outra verdade - não pretendo me desconstruir tanto assim. Que talvez possa servir pra mais alguém provavelmente jamais saberei - resta um convite a se aventurar. Que tal agora?
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