segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Cinema / Pérolas do Netflix - Beasts of No Nation

De: Cary Joji Fukunaga. Com: Abraham Attah, Idris Elba e Ama K. Abebrese. Drama / Guerra. EUA, 2015, 137 minutos.

Muito já se falou sobre a mais nova produção original do Netflix, o primeiro longa-metragem desenvolvido totalmente pela empresa, Beasts of No Nation: seja da estratégia ousada em lançar o filme ao mesmo tempo nos cinemas e na plataforma para os assinantes (o que gerou um boicote às exibições por grandes redes de cinema que não aceitaram o acordo), ou pelo impacto proporcionado pela obra dirigida (e fotografada) por Cary Joji Fukunaga (o mesmo da primeira temporada de True Detective, e também do excelente - e aqui resenhado - Sin Nombre) nos espectadores. E, realmente, qualidade é o que não falta às produções originais do serviço de streaming, tais como as séries já premiadas House of Cards e Orange is the New Black, o que volta a se confirmar aqui nesta poderosa obra - desde já aposta ferrenha da empresa para concorrer com os grandes estúdios às premiações do Oscar 2016.

O filme (baseado no livro homônimo de Uzodinma Iweala) conta a história de Agu (Attah, impressionante), menino africano cuja infância é interrompida devido ao assassinato de sua família durante uma guerra civil em um país africano que não sabemos qual é. Ao conseguir escapar, Agu vai parar em meio a uma floresta onde encontrará um grupo de milicianos liderados pelo comandante (cujo nome não saberemos) interpretado de forma intensa por Idris Elba. Dono de uma personalidade ao mesmo tempo amedrontadora e paternal, o comandante treinará Agu para ser mais um soldado de seu exército sanguinário, fazendo a criança passar por diversas situações que para quem assistiu Cidade de Deus soarão familiares.


Apesar de retratar uma situação que sabemos ser real - Fukunaga disse querer contar a história após ver fotos de meninos africanos armados e com roupas de guerra - a bela fotografia (com ecos de Terrence Malick e Apocalypse Now) consegue captar momentos oníricos que contrastam de maneira eficaz com a violência gráfica de vários momentos da narrativa. A sensação de "realidade paralela" também é evocada através da trilha sonora e da constante sensação de pesadelo, além de não sabermos exatamente onde e quando a trama está sendo passada, o que de forma alguma alivia o peso da história que está sendo contada. Além do mais, ao vermos no início do filme a brincadeira das crianças com uma TV velha, sinalizando a homenagem ao cinema e seus gêneros - que atua como forma de fuga daquela realidade tão hostil - percebemos ser esta a mesma lente que servirá para contar a tragédia destes meninos.

Mas o destaque aqui sem sombra de dúvidas é o ator mirim estreante Abraham Attah, que consegue a difícil proeza de retratar a transformação de criança inocente e cheia de sonhos a um "adulto" assassino e fruto de seu meio repleto de violência e carente de afeto e felicidade. Contando ainda com um final doloroso e repleto de significados, o filme é uma experiência exaustiva (no melhor dos sentidos) que ficará muito tempo na mente do espectador e à qual não iremos querer retornar tão cedo. Beasts of No Nation é grande cinema, com interpretações viscerais e uma produção de cair o queixo. Impactante, belo, violento e ambicioso, o filme é mais um ponto na trajetória de sucesso do Netflix e do seu talentoso diretor, e que não será surpresa se estiver presente nas maiores premiações do cinema referentes ao ano que passou. Resta saber o que vai vir daqui pra frente.

Nota: 9,0.

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