segunda-feira, 12 de maio de 2025

Novidades em Streaming - O Bom Professor (Pas de Vagues)

De: Teddy Lussi-Modeste. Com François Civil, Toscane Duquesne e Mallory Wanecque. Drama / Suspense, Bélgica / França, 2024, 90 minutos.

[ATENÇÃO: TEXTO COM OS MAIS VARIADOS SPOILERS]

Quem já assistiu ao ótimo filme dinamarquês A Caça (2012) lembra do sentimento de revolta pelo qual somos tomados, frente a uma grande injustiça - no caso, um professor de séries iniciais sendo acusado de abuso sexual e as graves consequências disso. Mesmo sem provas, a situação escala e, verdade seja dita, ainda que inocentado, a pecha de abusador nunca mais sairá de sua testa - como nos lembra a brilhante conclusão da envolvente produção de Thomas Vinterberg. No caso de O Bom Professor (Pas de Vagues), a situação é mais ou menos parecida. Temos um docente do primeiro grau que, depois de uma brincadeira meio boba em sala de aula, vê sua reputação, sua carreira e quase toda a sua vida irem por água abaixo. Havendo aqui uma pequena diferença, que é o fato de professor ser gay e morar com seu namorado - o que fará com que percebamos que, talvez, o buraco seja mais embaixo.

Bom, antes de mais nada, é preciso que se diga que não se trata de minimizar a importância do assunto e sim do fato de imputar crimes a alguém sem que de fato haja uma prova mais contundente. E quando o assunto são casos do tipo, as paixões parecem ainda mais exacerbadas, com parte da população já aparentemente desejosa de julgar, condenar e se possível destruir de todas as formas o "culpado". Linchar, matar, trucidar - e vamos combinar que essa sanha punitivista muitas vezes não é nem exclusividade apenas da extrema direita. Até que se prove o contrário, o abusador é o abusador, mesmo sem muitas certezas. Isso me faz lembrar, aliás, outra excelente produção, no caso o ótimo Dúvida (2008) que é concluído com uma Irmã Aloysius (personagem de Meryl Streep, sempre maravilhosa) aos prantos, afirmando ter dúvidas depois de um padre/professor cheio de carisma, com métodos mais inovadores e bastante próximo dos alunos, ser expulso do educandário por talvez ser um pedófilo. 


 

Só que diferente do que ocorre no filme estrelado pelo saudoso Philip Seymour Hoffman, aqui não parece haver muita margem pra incerteza. Tudo o que há são os alunos exacerbados, após o professor de francês Julien (François Civil) fazer um elogio ao cabelo da introspectiva estudante da sétima série Leslie (Toscane Duquesne), como parte de uma explicação sobre figuras de linguagem. Visivelmente desconfortável, Leslie leva a questão adiante: apresenta uma carta à diretoria, onde denuncia uma sequência de atitudes de Julien que, supostamente, evidenciariam os abusos. O que vai de situações episódicas, como dirigir o olhar a ela, a frases mais ambíguas, como quando o educador afirma gostar de tomar água para se "refrescar". O que ele teria dito dando uma mordidinha provocadora no lábio. Com a tensão estabelecida, caberá a Julien se esforçar para apagar a imagem já criada - e não ajudará em nada o fato de um bando de crianças da sétima série se mostrarem dispostos à agitar o entorno.

Leslie tem um irmão que parece - salvo algum estereótipo -, muito mais abusivo do que Julien. Aliás, irritado, o rapaz ameaça de morte o professor. Mas também ameaça a menina, para o caso de ela estar mentindo. No educandário, os demais docentes não parecem muito animados em apoiar Julien - cada qual preocupado apenas com as suas carreiras e os possíveis desgastes que a situação poderia gerar. Com tudo piorando quando vaza um vídeo íntimo do protagonista em uma noitada em uma boate gay, sendo apenas feliz ao lado do seu companheiro. "Talvez isso pudesse ter te ajudado dessa vez", afirma alguém em certa altura, de maneira meio torta. Em tempos em que os dedos parecem todos apontados para os professores, para seus métodos, para o que escolhem como parâmetros de ensino, uma obra como essa dirigida por Teddy Lussi-Modeste que, de quebra é inspirada em eventos reais ocorridos com o próprio, se converte em um verdadeiro filme de terror e um verdadeiro desafio para pedagogos mundo afora. Afinal, a homofobia não pode dar espaço para a censura. Ou impedir um professor de exercer seu ofício com dignidade. O gosto é amargo. Mas propor a reflexão já é um começo.

Nota: 8,0 


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