segunda-feira, 4 de março de 2024

Cinema - Meu Amigo Robô (Robot Dreams)

De: Pablo Berger e Sara Varon. Animação / Drama, Espanha / França, 2023, 98 minutos.

Uma linda fábula sobre amizade (e amor). E sobre as marcas que as pessoas - ou os robôs e os cachorros - deixam em nossas vidas. Independente da estação do ano, seguir vivendo sempre será preciso. Sim, a gente vai sonhar, vai devanear, vai fantasiar. Tudo será meio estranho e de difícil explicação. Mas a vida é assim: com o tempo iremos superar. Vamos combinar que é quase estranho ser tão filosófico ou existencial quando o assunto é apenas uma carismática animação - no caso Meu Amigo Robô (Robot Dreams), uma das indicadas ao Oscar em sua categoria. Mas esse é o tipo de projeto que nos faz refletir sobre tudo isso. Sobre como viver é uma grande experiência cheia de altos e baixos, de alegrias e de tristezas e até de incertezas diante de tudo. As memórias, assim como no caso da nostálgica e pegajosa música September do Earth, Wind & Fire são pra sempre.

Ao cabo, esse é aquele tipo de filme que talvez passasse meio despercebido não fossem as premiações. E que bom que ele apareceu em nossas vidas. Ok, não há grandes revoluções aqui, para além da completa ausência de diálogos (que nem é algo tão inovador assim). Talvez nada que não tenhamos visto antes. Mas a dupla de protagonistas é tão magnética que é meio difícil de resistir. E como se já não bastasse a simpatia natural da coisa toda, a trama ainda se passa nos anos 80, época de tecnologia incipiente, de jogos como Pong servindo de passatempo para aplacar o tédio, de cartazes de Dark Side of the Moon do Pink Floyd na parede. Enfim, a vida de Cão parece ser meio solitária. Todas as noites o mesmo prato de comida - feito no microondas. E a triste rotina de quem não tem alguém para compartilhar as alegrias e as angústias da vida - e espiar um apaixonado casal vizinho, por meio de sua janela, não ajudará tanto.


 

Só que a coisa muda de figura quando ele vê na TV um anúncio de um robô, que se torna a oportunidade ideal de simplesmente adquirir um novo "amigo". E é assim que a coisa acontece. Quando Robô chega ele o monta, convertendo-o, após algum tipo de estranhamento inicial, na sua companhia mais do que ideal pelas ruas da Manhattan de décadas atrás. Tudo vai mais ou menos bem - com as visitas ao parque, fast food como alimentação e os banhos de mar -, até o dia em que Robô fica, literalmente, empacado na areia da praia. O caso é que depois de ser molhado, suas engrenagens simplesmente enferrujam, o que impede Cão de levá-lo consigo (por ser muito pesado). E como desgraça pouca é bobagem tudo piora quando ele retorna no dia seguinte e a praia está fechada, totalmente lacrada, sendo possível acessá-la apenas no próximo verão. E ele até tentará entrar no local. Mas será em vão. Terá que aceitar sua sina, enquanto seu amigo metálico acolhe comoventemente o seu destino: o de ficar deitado no mesmo lugar por tempo indeterminado.

Elaborada com um traço vivíssimo, a obra contrasta as cores vibrantes e quentes, com a melancolia meio subjacente que é evocada pelo cenário apresentado. Apartados, os dois amigos (ou amantes, nunca fica exatamente claro, mas bem que poderia ser) tocarão suas vidas, viverão outras aventuras, conhecerão outras "pessoas" (no caso bichos) e sonharão. Sim, surpreendentemente, Robô é capaz de sonhar. Como se fosse um Homem de Lata de O Mágico de Oz ele imagina as próprias aventuras, enquanto Cão se ocupa em passar seus meses entre resorts, estações de esqui e até empinando pipa. Em alguma medida esse é um trabalho tão simples, que parece que estamos sempre esperando um grande acontecimento. Mas como já comentei, esse é um filme em que menos é mais. É sobre como ruminamos pensamentos enquanto aguardamos dias melhores. Ou de como esperamos o inverno simplesmente passar para o verão chegar. Ou ainda sobre o vazio da solidão forçada sendo substituído ali adiante pelas casualidades dos novos e inevitáveis encontros. Que um projeto tão aparentemente infantil elabore tudo isso, é algo apenas emocionante.

Nota: 8,5


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