quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Picanha.doc - Good Night Oppy

De: Ryan White. Com Angela Bassett (narradora). Documentário, EUA, 2022, 104 minutos.

É provável que poucas coisas sejam tão estadunidenses em matéria de cinema do que filmes ou documentários sobre expedições espaciais. Por si só esse tipo de sonho exploratório costuma ser grandioso, desafiador, monumental. E primoroso no que diz respeito à pesquisa, à engenharia, à ciência. Ou a tecnologia. Certamente um resquício da Corrida Espacial que colocaria Estados Unidos e União Soviética frente a frente nessa incansável busca que mobilizaria uma boa quantidade de dinheiro. E, nessa esteira, obras como a recém lançada Good Night Oppy, do diretor Ryan White, podem até não ser assim tão exibicionistas. Ainda que mantenham, aqui e ali nas entrelinhas, uma espécie de "patriotismo estrutural" que se inicia em salas de comando da Nasa e que culminará em foguetes engenhosamente projetados para nos levar ao universo e além.

Aqui temos a história das sondas espaciais Spirit e Opportunity, dois veículos exploradores que foram enviados a Marte em 2003 - e que alcançariam o Planeta Vermelho em 2004, com o objetivo de localizar pistas nas rochas e no solo, que pudessem indicar a presença de água no passado. Água potável, no caso. Que fosse possível beber. O que, por consequência, também poderia sugerir a existência de um ambiente propício à vida. Como documentário, o filme se distancia do ideal acinzentado, frio e maquínico que poderia emergir dos cubículos dos laboratórios da Agência - com engenheiros, mecânicos, cientistas e pesquisadores debruçados sobre planilhas e de olhos atentos a computadores - para entregar uma experiência que tenta, de alguma forma, humanizar os robôs. Convertendo ainda a imensidão e o senso de isolamento em um espaço de exaltação do esforço coletivo.



Projetados para terem uma vida útil de apenas 90 dias por causa das complicadas condições climáticas de Marte, Spirit e Opportunity (este, carinhosamente chamado de Oppy) se tornariam prodígios da longevidade - com o primeiro sendo desligado em 2010 e o segundo em 2019, após mais de 5 mil dias de atividades. E essa história particular de perseverança dos dois equipamentos, que enfrentariam não apenas o terreno acidentado, mas também o frio, o calor, as tempestades de areia e mesmo o desgaste natural de suas estruturas - que operariam todo esse tempo por meio de um sofisticado aparato com instalação de placas de energia solar -, funciona como uma espécie de alegoria para as vidas de vários integrantes das equipes e de seu empenho em colocar o projeto em prática. Indo e vindo no tempo, a obra parte do mero esboço, até chegar a consolidação, para depois avançar para a rotina de contato com os robôs. O que faria com que figuras como o cientista-chefe Steve Squyres e a gerente de missão Jennifer Trosper, passassem a considerar as sondas como se fossem parte da família.

E não é por acaso o esforço de todos para o resgate do ânimo quando ambos os robôs passam por alguma desventura, seja alterando a sua lógica de funcionamento, seja colocando alguma "música de despertar" que dialogue com as situações vividas - caso do momento em que, por exemplo, os integrantes utilizam SOS do Abba, após a Spirit ser afligida por um problema mecânico. O mesmo valendo para Here Comes the Sun dos Beatles que aparece após uma severa tempestade, que quase leva Oppy à "morte". Intercalando imagens de arquivo com o belo trabalho gráfico da equipe de efeitos especiais da Industrial Light & Magic, Boa Noite Oppy pode soar meio anacrônico ou deslocado no tempo, agora que as preocupações mundiais parecem bem outras (com pandemia, guerras, ascensão da extrema direita, colapso ambiental e outros). Mas ainda assim se trata de uma experiência simpática, de narrativa fluída, que ainda acrescenta uma ou outra dose de suspense na trama. Tá na Amazon e poderá ser um dos documentários indicados ao Oscar - premiações não faltam. Resta aguardar.


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