quinta-feira, 22 de julho de 2021

Tesouros Cinéfilos - Pig

De: Michael Sarnoski. Com Nicolas Cage, Alex Wolff e Adam Arkin. Drama / Suspense, EUA, 2021, 92 minutos.

Um filme com o Nicolas Cage interpretando um sujeito solitário, levemente obeso, com os cabelos compridos e a barba por fazer, que mora sozinho em uma casa isolada no deserto do Oregon com a sua... porca. Porca que, não tardará, será sequestrada, sem que saibamos o seu paradeiro. Vamos combinar, desde que Pig, projeto do diretor estreante Michael Sarnoski foi anunciado, os fãs do "astro" ficaram agitados. E não é para menos. Famoso pela carreira com muito mais baixos do que altos, Cage tem aqui uma oportunidade de redenção - que ele agarra, é preciso que se diga. A obra gira toda em torno do sujeito e da verdadeira via crúcis que ele empreende na busca de seu animal. Mas se engana quem pensa que, aqui, encontraremos o arco narrativo clássico do homem que sofre algum tipo de violência ou abuso e parte para uma jornada de vingança contra seus agressores, com tiro, porrada e sangue sendo veículo de redenção. O clima é muito mais taciturno, cheio de simbolismos, com uma melancolia latente.

E admito que, de alguma forma, essa quebra de expectativas foi o que mais me agradou. Seria muito cômodo entregar para os fãs aquilo que o hype provavelmente previa: ver Cage como o ermitão embrutecido que geraria uma trilha de violência por onde passasse. Mas essa mesma violência surge em cena não apenas como uma metáfora inesperada (naquela sequência que parece emular uma espécie de Clube da Luta de funcionários de restaurantes), como ela reaparece de forma dolorida nas memórias do próprio protagonista. Acompanhado do jovem Amir (Alex Wolff), Rob (Cage) se revela, de forma quase tópica, como uma figura de passado relevante - ele era chef de um restaurante em Portland -, que se torna recluso após a ocorrência de uma tragédia. Partir em busca de sua porca - que lhe auxiliava na colheita de trufas que ele comercializa para o próprio Amir -, será chafurdar em um passado doloroso, em que memórias serão reviradas e em que perdas precisarão ser superadas.


Ao cabo, trata-se de um filme que nem sempre será fácil, já que ele parece se valer do estranhamento como uma espécie de "virtude". Sim, a porca, Cage cabeludo e soturno, as paisagens isoladas, a condução de fluidez vagarosa, tudo parece contribuir para esse clima meio excêntrico, de quebra-cabeças que necessita ser montado. Nesse sentido, a obra eventualmente parece formada por instantes episódicos, por atos isolados e quase fragmentados que, organizados como uma colcha de retalhos, permitirão ao espectador tirar as suas conclusões. É aquele tipo de obra aberta, que não possui uma lógica de começo meio e fim estabelecida. Do começo do filme - e do estabelecimento de seu dilema central -, à conclusão, o que acompanhamos é um homem que confrontará aquilo que, emocionalmente o devasta, enquanto reúne forças na intenção de, vá lá, se redimir. A briga, assim, não é externa, contra aqueles que lhe violam. É interna, contra aquilo que aflige as entranhas.

Alguns exagerados já estão considerando a possibilidade de Cage ser indicado ao Oscar na próxima premiação - e, nunca é demais lembrar que Hollywood adora uma boa história de "redenção" entre seus astros, que podem sair do ostracismo (ou da decadência) para, em pouco tempo, se tornarem figuras requisitadas e de altos salários. Foi assim com Robert Downey Jr., Michael Keaton e Mickey Rourke, pra ficar em três exemplos. Se Cage conseguirá sair das frequentes nominações ao Framboesa para voltar a ser cotado para o mais famoso carecão dourado do cinema, ainda não temos como saber - e nunca é demais lembrar que o astro já faturou a estatueta de Melhor Ator em 1996, pelo clássico cult Despedida em Las Vegas (1996). E, vamos combinar, a entrega dele neste papel é realmente comovente, uma vez que evita a caricatura, apostando em nuances, olhares e outros cacoetes que formam a personalidade complexa desse protagonista - e que ajudam a tornar o filme melhor do que, aparentemente, ele poderia ser.


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