quarta-feira, 21 de julho de 2021

Picanha em Série - Hacks

De: Desiree Akhavan, Lucia Aniello e Paul W. Downs. Com Jean Smart, Hannah Einbinder e Carl Clemons-Hopkins. Comédia, EUA, 2021, 310 minutos.

Eu confesso a vocês que tenho assistido poucas séries - dado o investimento de tempo necessário pra que acompanhemos esse tipo de produção. Mas fui atraído por Hacks não apenas pelo hype, mas também por ser uma comédia da HBO Max de apenas 10 episódios, de cerca de meia hora cada. Ou seja, algo relativamente tranquilo pra quem gosta de maratonar algo no final de semana. E, sinceramente, eu não paro de me impressionar com a HBO, já que Hacks é simplesmente espetacular. Da sua premissa, passando pelas piadas (e pelo roteiro engenhoso), tudo é divertido e leve, deixando espaço para algumas reflexões sobre temas como, feminismo, papel da mulher na sociedade, busca desenfreada pelo capital e conflitos geracionais. Indicada ao Emmy, Jean Smart dá vida a Deborah Vence, uma veterana comediante de formato stand up que, próxima dos setenta anos de idade, precisar oxigenar a sua carreira, que parece estar em decadência. É aí que ela contrata, meio a contragosto, a jovem Ava (Hannah Einbinder), com a intenção de atualizar o seu repertório de piadas. E, bom, se essa premissa por si só já é ótima, imagina o resto!

Como de praxe nesse tipo de produção, essa será a história a respeito de duas pessoas que são completamente opostas uma da outra que, aos poucos, se aproximarão, estabelecendo algum tipo de amizade. Sim, Deborah se torna a "patroa" meio involuntária de Ava, uma jovem meio petulante que, nos dias atuais, seria aquela cruza entre as gerações Z e millenial. Desse contraste, brotam algumas das grandes sacadas de Hacks. Mas também muitos momentos emocionantes - como aquele em que, no terceiro episódio, a jovem resgata materiais antigos da veterana (guardados em um porão), para se dar conta do pioneirismo desta em um universo povoado não apenas por homens, mas por homens misóginos, toscos e abusivos. Sim, Ava, como muitas jovens, tem o ímpeto de mudar o mundo, tornando-o um espaço mais adequado para as mulheres. Só que ela parece esbarrar apenas na "força do discurso", enquanto a sua atual empregadora, por mais eventualmente espalhafatosa que ela possa parecer, exercitaria esses ideias na prática, nos ainda ultraconservadores anos 70.

E isso, no fim, fará com que elas percebam que, sapatos de salto alto e tênis street a parte, elas não são assim tão diferentes. E admito que vê-las, em uma das primeiras sequências juntas, atacando uma a outra com as mais bárbaras agressões em formato de piadas irônicas (e baixas) é um dos grandes instantes da temporada. E que dá conta dessas semelhanças entre ambas. As épocas são diferentes mas, ao cabo, as intenções seguem as mesmas. E, conforme Ava mergulha no universo de Deborah, a jovem passa a mudar também o olhar para si, para os seus comportamentos e hábitos. Sim, pagar boletos, tomar café da manhã e utilizar hashtags pode ser cringe para essa as novas gerações. Mas vergonha alheia MESMO é ficar perguntando se o restaurante oferece leite de soja com o objetivo de pagar de ambientalista. Oi? Soja? E, nesse sentido, a série é certeira em seus comentários sociais, deixando espaço para a critica à "militância de sofá", representada pelo jovem que questiona comportamentos do passado, mas que os reproduz no presente (ainda que, sob outros formatos).

Alternando momentos engraçadíssimos, com outros mais comoventes, a série ainda é perspicaz ao se apropriar das mais variadas referências culturais para fazer graça - e, eu particularmente adoro a metalinguagem como característica. É o caso, por exemplo, do momento em que alguém revela o fato de certa pessoa estar trabalhando em um filme do Richard Linklater, mas que o resultado disso só será sabido em 12 anos. Fora isso há espaço para citações à Thelma e Louise (1991), Liberace, Selena Gomez que surgem de forma natural, enquanto a dupla central convive com outras figuras que influenciam diretamente em suas vidas - caso do ótimo assistente de Deborah, Marcus (Carl Clemons-Hopkins), do produtor Jimmy (Paul W. Downs) e da filha da comediante DJ (Kaitlin Olson). E, no mais, eu dispensaria a destrambelhada Kayla (Megan Stalter), que parece ter sido escalada apenas pra fazer o papel da "gordinha atrapalhada". Renovada para a segunda temporada, a série abocanhou diversas indicações ao Emmy, entre elas na categoria Série de Comédia. A premiação ocorre em 19 de setembro e, não vamos negar, já tem a nossa torcida!

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