quarta-feira, 23 de maio de 2018

Tesouros Cinéfilos - Body (Cialo)

De: Malgorzata Szmowska. Com Justyna Suwala, Janusz Gajos e Maja Ostaszewka. Comédia dramática, Polônia, 2015, 89 minutos.

Não é por acaso que o filme da diretora polonesa Malgorzata Szmowska (Elles) se chama Body (Cialo) - uma vez que cada uma das três protagonistas possuem algum tipo de relação com o "corpo". A começar pela jovem Olga (Justyna Suwala), que sofre de bulimia e tem dificuldade de aceitar o seu corpo, especialmente após a morte da mãe. Já o seu pai (Janusz Gajos) é um perito que trabalha com criminalística e realiza relatórios para a polícia - o que faz com que se depare, frequentemente, com mortes (e até mesmo corpos dilacerados). Entre os dois está a terapeuta Anna (Maja Ostaszewka), que mistura técnicas corporais com espiritismo, com a intenção de fazer com que os seus pacientes superem eventuais traumas - tendo ela mesma, no passado, perdido o filho de apenas oito meses de idade.

Ainda que a obra pareça excessivamente pesada ou melancólica, há no conjunto uma mistura meio geral de drama, de comédia e até de suspense - especialmente no que diz respeito ao componente religioso do roteiro. O fio condutor da trama é a relação entre pai e filha que, juntos, tentam superar a dor da perda de um ente querido. Emocionalmente distantes, possuem pouca afinidade, o que se estabelece como um dos principais conflitos da narrativa. Ainda assim, a diretora se mostra pouco interessada em transformar a película em um dramalhão sobre a jornada de duas pessoas em busca da redenção - ainda que isso inevitavelmente ocorra, no terço final - e parece muito mais disposta a costurar a película com uma série de pequenas sequências que podem ser divertidas, excêntricas e curiosas na mesma medida.



Por exemplo, como explicar a presença de um cachorro enorme que convive com Anna em um apartamento diminuto? E o que dizer da sequência em que uma mulher de meia idade dança nua, enquanto o protagonista a observa? E a cena em que um homem se enforca e, depois de dado como morto, levanta e sai caminhando como se nada tivesse acontecido? Aqui e ali estão, novamente, questões relacionadas ao corpo que, jogadas na cara do espectador, tem muito mais a ver com a crença na naturalidade da carne do que na existência de um sentido maior (ou ideológico) do corpo enquanto ente político. (e se há uma grande decepção na obra é o fato de ela jamais se aprofundar nos debates em que ela passa de raspão, especialmente em temas como o aborto e a existência ou não de vida após a morte)

Ainda que nunca soe panfletário, o filme aposta forte no componente espírita, devendo cair nas graças dos espectadores que são adeptos da doutrina - e a citação a Divaldo Pereira Franco (e a sua indefectível frase que diz quem "quem ama não fica doente"), acaba sendo a cereja do bolo. Com boas caracterizações e montagem caprichada, a obra anda conta com uma série de enquadramentos oblíquos e ângulos de câmera curiosos, que contribuem para a sensação de estranhamento que rege a película como um todo. (e ver um liquidificador processando ao mesmo tempo massa parafuso e bolo também é um indicativo dessa proposta mais caótica) Méritos para a diretora, que faturou o Leão de Prata no Festival de Veneza de 2015.

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