terça-feira, 25 de outubro de 2016

Cinema - O Lar das Crianças Peculiares (Miss Peregrine's Home For Peculiar Children)

De: Tim Burton. Com Eva Green, Asa Butterfield, Samuel L. Jackson, Judi Dench e Terence Stamp. Aventura / Fantasia, EUA / Bélgica / Reino Unidos, 2016, 127 minutos.

Em seu filme anterior, o injustiçado Grandes Olhos (2014), Tim Burton parecia ter abandonado, ao menos em partes, o tão característico estilo sombrio, de personagens excêntricos e de figurinos espalhafatosos, para apostar em uma paleta mais colorida, sóbria e menos soturna, a despeito da alta carga dramática da película protagonizada por Amy Adams e Christoph Waltz. Parecia uma nova guinada artística para o diretor? Qual nada. Bastou o anúncio de que já estava engatilhada uma adaptação para o livro O Orfanato da Srta. Peregrine Para Crianças Peculiares, do escritor Ransom Riggs, para que o público tivesse a certeza de que veria, novamente, mais uma película bem ao estilo Tim Burton. E, como filme (não li o livro), pode-se dizer que, se O Lar das Crianças Peculiares (Miss Peregrine's Home For Peculiar Children) não chega a ter o impacto de um Edward Mãos de Tesoura (1990) ou de um A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (1999), ao menos não decepciona.

A trama tem bem o estilo daquelas que fariam (ou farão, vai saber) sucesso na Sessão da Tarde, com crianças que convivem com o bullying na escola e com o distanciamento dos pais, tendo que superar os problemas emocionais que as colocam na condição de seres isolados em um mundo que não é o delas. Aliás, um mundo ao qual, literalmente, elas não pertencem - numa metáfora muito bem conduzida para aqueles baixinhos com problemas de adaptação a qualquer tipo de ambiente em que não se sintam confortáveis. Sim, é um filme infantil e há que se respeitar essa lógica que, tradicionalmente, acompanha os filmes de Burton. Se há personagens fantásticos eles nunca serão terrivelmente amedrontadores, estando sempre no limite entre o farsesco e o assustador, entre o engraçado e o temível. Não é por acaso que, se num instante eles provocam (e até assustam), no seguinte soltam uma gracinha, um alívio cômico - ou uma risada histriônica, que seja - que lembrará a todos os espectadores de que aquilo não passa de uma ficção (deliciosa de se assistir, por sinal).


A história segue os passos de Jake (Asa Butterfield) que, após a estranha morte de seu avô, de nome Abe (Terrence Stamp), parte com seu pai para o País de Gales, atrás de pistas que possam esclarecer o que pode ser ocorrido com o idoso, que teve os seus olhos arrancados em um aparente caso de assassinato. Em seus últimos instantes, o homem balbucia algumas palavras desconexas a Jake, relacionadas a histórias de infância que este lhe contava e sobre a existência de uma certa Srta. Peregrine (Eva Green), que poderia ser a chave para que o enigma fosse esclarecido. Ao chegar ao seu destino, o rapaz percebe que o local é uma mansão em ruínas, que foi atingida por um míssil durante a Segunda Guerra Mundial. Após uma investigação na área, Jake descobre a existência de uma fenda temporal que lhe conduz ao local onde Peregrine vive e protege crianças dotadas de poderes especiais de seres do mal conhecidos como "etéreos".

Sim, não há exatamente uma novidade no que diz respeito ao arco dramático e a maioria dos filmes do gênero bebem na fonte dessa cartilha, com jovens personagens vivendo grandes aventuras na busca da superação de problemas. As comparações com os X-Men são inevitáveis e é realmente impossível não pensar nos mutantes capitaneados pelo Professor Xavier, conforme vão sendo apresentadas na tela cada uma das habilidades das crianças peculiares - uma delas com poder de invisibilidade, outra com o estômago cheio de abelhas (!), uma terceira tão leve que precisa utilizar sapatos de chumbo, e por aí vai. Por sinal, parte da diversão está justamente na descoberta dessas características, que vão sendo desvendadas aos poucos, e que culminam em revelações relacionadas ao protagonista que, a moda de Percy Jackson, Katniss Everdeen (de Jogos Vorazes) ou Tris (da série Divergente) - para citar três outros exemplos da literatura infanto-juvenil - também passa por um período de provação.


Longe de querer transformar O Lar das Crianças Peculiares em um ato maior dentro de sua filmografia, Burton parece muito mais interessado em divertir e se divertir. E se a inclusão de Samuel L. Jackson como um excêntrico e exagerado vilão se constitui em um dos pontos positivos do filme - o mesmo valendo para a atuação segura de Green, que chega até mesmo a comover na pele de Peregrine - o mesmo não se pode dizer de Butterfield, que, apático, não parece muito a vontade em um papel deste tamanho. Outro ponto questionável envolve o clímax. Sem uma grande batalha ou um enfrentamento final apoteótico, a impressão que se tem é a de que o epílogo fica apenas diluído e, sem maiores emoções, perde força. Isso sem falar na bagunça, com um emaranhado um tanto confuso, em que distinguir o que se está vendo se torna tarefa bastante complicada - algo piorado com a adoção do 3D, apenas como um (aparente) capricho. Ainda assim, em uma análise geral, dado o visual bacana e os personagens interessantes, o saldo é positivo.

Nota: 7,3

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