De: Florian Zeller. Com Zen McGrath, Hugh Jackman, Vanessa Kirby, Laura Dern e Anthony Hopkins. Drama, EUA, 2022, 123 minutos.
Em uma das raras cenas efetivamente bonitas - na falta de outro adjetivo - de Um Filho (The Son) o jovem Nicholas (Zen McGrath) dança junto com seu pai Peter (Hugh Jackman) e com sua madrasta Beth (Vanessa Kirby) ao som de It's Not Unusual de Tom Jones. O cenário é o apartamento de Peter e ali está rolando uma tentativa meio desajeitada de aproximação entre os três - naquele ponto a relação já está um tanto complicada, por conta da sensação de abandono e da consequente depressão severa que assola a alma de Nicholas. Aliás, uma grave doença que, em muitos casos, é difícil determinar exatamente de onde vem. Na mesma cena a câmera lenta foca Peter e Beth bastante animados enquanto movem o corpo para, imediatamente após, um travelling colocar Nicholas em primeiro plano, paralisado, com os olhos fixos em lugar indefinido. É a forma criativa que o diretor Florian Zeller encontrou para dizer ao espectador que o jovem pode até estar ali. Mas somente de corpo. Sua mente, ao cabo, está em outro lugar.
E é justamente o dilema de como lidar com um filho com um grave problema psicológico, que está no centro da narrativa dessa espécie de continuação de Meu Pai (2020) - ambas adaptações de peças teatrais do próprio Zeller (a primeira, aliás, vale lembrar, rendeu o Oscar de Roteiro Adaptado e de ator para o veterano Anthony Hopkins). Só que tudo que a experiência anterior parecia ter de empática e compreensiva com a doença do idoso à beira da demência vivido por Hopkins, se dilui em um caleidoscópio de tentativas e erros que parecem apenas frustrantes ao tentar apontar quais as origens da depressão do jovem. E eu não sei, sinceramente, se isso é muito saudável para quem está do lado de cá da tela. Conforme o filme avança, descobrimos que Peter trocou a ex-esposa Kate (Laura Dern) pela jovem Beth. Uma tentativa de dar um novo rumo pra própria vida e tentar ser feliz? Ou apenas egoísmo de um pai de família, que se refletirá em uma carga de dor sem fim nos ombros do filho (como por vezes a obra parece direcionar)?
Ainda assim, ao menos o filme foge do clichê totalmente formulaico do péssimo pai - não que Peter seja um exemplo em tudo -, que resultará em um filho traumatizado. Nos flashbacks não há cenas de agressões físicas ou psicológicas, de bebedeiras ou de qualquer sequência derivativa de instabilidade parental que é típica do gênero. Ao contrário. Em certa altura somos brindados com um belo instante onde o trio está em um passeio de barco em um dia ensolarado - o chapéu de Kate, que surge exuberante na proa, voa para longe. Todos riem. Na sequência, Peter está com o filho que não deve ter mais do que seis anos dentro da água, ensinando-o a nadar. Um esforço bonito, comovente. Um momento alegre de pai e filho, no estilo daquele meme do pai que fica genuinamente feliz ao ver o seu pequeno dar as primeiras pedaladas de bicicleta. Alegrias, tristezas, anseios, sonhos, decepções. A vida é um turbilhão e ninguém nunca estará efetivamente preparado para os acontecimentos. E um dos acontecimentos é que Peter e Kate se separam sem muita explicação. E mais adiante Nicholas para de ir às aulas. O que se soma ao fato de não ter amigos, não ter interesses. "A vida está me pesando. Quero que algo mude mas não sei o quê", clama em certa altura o adolescente.
Ok, se o objetivo do filme era chamar a atenção (ou horrorizar) os pais para os perigos da depressão adolescente e da necessidade de uma permanente "vigilância" pautada pelo diálogo e, especialmente, por tratamentos terapêuticos e com medicamentos, dá pra se dizer que a obra tem seu ponto. Não dá pra virar as costas e achar que é apenas mimimi - e a cena em que Anthony Hopkins aparece, quase resvala no chavão do "na minha época era bem pior e olha como estou agora". Mas ao mesmo tempo me deixou meio incomodado a persistência da ideia do trauma impossível de lidar, ser oriundo de um divórcio entre pais que eram felizes juntos e, agora, não são mais. Reduzir a existência de qualquer fiapo de felicidade de Nicholas a condição de ver os pais casados me parece pequeno. E quase injusto com todos ali. Mas o caso é que a depressão muitas vezes não têm muita explicação, sendo capaz de assolar mesmo aqueles que consideraríamos estar em uma vida boa, confortável. Fazer filme sobre o tema é difícil. É um assunto tabu. E nem sempre o resultado será totalmente a contento. E aqui temos um meio termo: nem o desastre que parte da crítica está apontando. Nem a exuberância da obra anterior de Zeller. Vocês, como sempre, estão convidados a assistir - está disponível no Now e em outras plataformas. E a dar o veredicto.
Nota: 6,5
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