De: Ludovic Bernard. Com Ahmed Sylla, Alice Belaïdi, Moussa Maaskri e Umesh Tamang. Comédia / Drama, França, 2017, 103 minutos.
Estava querendo assistir a um filme mais leve em uma dessas noites frias e fui direcionado, meio que aleatoriamente, para este A Escalada (L'ascencion), curiosa obra baseada em fatos reais, que conta a história do primeiro franco-argelino a conseguir escalar o Monte Evereste. Vou dizer a vocês que tive, ao menos em partes, o meu objetivo alcançado. Não, não se trata de nenhum filme inesquecível sobre esportes de aventura e muito menos uma película surpreendentemente engraçada. Mas tem lá seus bons momentos, gerados muito mais pela excentricidade geral do episódio do que por qualquer outra licença poética do roteiro - ainda que sejam várias as existentes na narrativa. Na trama somos apresentados a Samy (Ahmed Sylla), sujeito comum, sem muitas perspectivas de vida, que resolve embarcar nessa jornada de autoconhecimento, como forma de ratificar o seu amor por Nadia (Alice Belaïdi), uma antiga colega de escola.
Aliás, a ideia um tanto estapafúrdia surge de uma forma bastante esquisita: em uma noite em que Samy sai com Nadia cheio de "segundas intenções", a jovem dá um chega pra lá no sujeito, escancarando a falta de futuro (financeiro, inclusive) naquela relação. Meio desesperado, Samy alega que faria qualquer coisa para poder ficar com ela, até mesmo "escalar o Monte Evereste". E é a partir dessa frase meio jogada no ar, que o objetivo ganha forma, especialmente após o protagonista conseguir um patrocínio de cerca de R$ 40 mil, que poderá lhe ajudar em seu intento. Apoiado ainda por uma rádio local, que acompanhará a jornada com boletins diários, Samy parte num estilo meio Jamaica Abaixo de Zero (1994) do alpinismo. Em meio à ingleses, alemães, japoneses e outros aventureiros saídos de países ricos, o nosso heroi se torna o único negro com este propósito de vida, enfrentando os mais variados tipos de preconceitos - fora os próprios desafios saídos das montanhas geladas.
E eu confesso que o que mais me agradou na experiência foi poder conferir de perto como funciona a logística desse tipo de projeto. Do sopé da montanha até o cume, vamos compreendendo desde o funcionamento de estratégias de respiração e de evolução, até os pontos de parada (e eles são vários no caminho). Aliás, o filme faz perceber que a missão poderia ser praticamente suicida se não fosse o suporte de alpinistas mais experientes e de nativos do Nepal que são conhecidos como "xerpas", que auxiliam em tarefas pesadas, como levar mochilas e equipamentos durante a escalada (em troca de algum dinheiro, claro). Por sinal, o filme nos faz perceber ainda o quão na moda está esse tipo de turismo, o de aventura, passando um tipo de mensagem, a meu ver, meio negativa a respeito desse tipo de desafio, que tem levado muitos aventureiros inexperientes à morte.
Mas no geral trata-se de uma obra que se aproveita de sua temática para apresentar belíssimas paisagens, trazendo ainda uma jornada de amadurecimento, que aproveita a amizade de Samy com o xerpa Johnny (Umesh Tamang) para adicionar camadas à narrativa (e confesso que as cenas em ambos trocam favores que envolvem leituras e aprendizados de técnicas de escalada, são daquelas que aquecem o coração). Aliás, aquece mais do que a química entre Samy e Nadia, que beira à ZERO - e o desastre só não é completo nas sequências derradeiras porque o roteiro faz alguns pequenos milagres técnicos, com o uso da trilha sonora e das escolhas de imagens (e do desenho de produção com o um todo). Em tempo: o nome verdadeiro desse aventureiro inusitado é Nadir Dendoune e sua história parece ser um tanto diferente daquela vista nas telonas. Mas um filme sempre vai ter lá as suas licenças poéticas - e esse aqui, que aposta ainda em relações familiares complexas, funciona a contento.
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