De: Simon Stone. Com Carey Mulligan, Ralph Fiennes, Lily James, Archie Barnes e Ben Chaplin. Drama, Reino Unido, 2021, 112 minutos.
Transformar uma história com ares grandiosos em algo mais íntimo talvez seja a chave para o "sucesso" desse A Escavação (The Dig) - uma das novidades da semana no catálogo da Netflix. É um filme que parte de um grande evento - no caso a descoberta do gigantesco parque arqueológico de Sutton Hoo, na Inglaterra, às vésperas do começo da Segunda Guerra Mundial -, para narrar a trajetória das pessoas envolvidas no episódio. Assim, por mais que o filme se ocupe do esplendor da revelação em si, o que rende ótimas tomadas aéreas e cenas variadas que mostram um barco intacto do Século VI e outros elementos e objetos que compõem a necrópole, interessa muito mais a forma com que escavadores, pesquisadores, museólogos e a família da dona das terras se relacionaram com esse fato. É nos vínculos (afetivos) entre os envolvidos que a obra do diretor Simon Stone ganha força, se tornando uma honesta experiência cinematográfica capaz de amarrar passado, presente e futuro com desenvoltura e elegância.
E eu confesso que não estava esperando muito. Mesmo. Por mais que os nomes de Carey Mulligan e Ralph Fiennes chamassem a atenção, pensava que a sessão pudesse soar meio modorrenta ou excessivamente contemplativa. Mas não. Na trama, Mulligan é a jovem viúva Edith Pretty que, interessada por arqueologia, contrata o experiente escavador Basil Brown (Fiennes) para explorar parte da área localizada em sua propriedade. O que inicia como um descompromissado e modesto trabalho vai se tornando algo maior, conforme as descobertas daquilo que realmente existe no terreno vão se descortinando. Em 1938 o nome da Hitler e os avanços da Alemanha Nazista já eram uma realidade: mas ali, naquele cenário bucólico, idílico, a batalha passa a ser outra quando entram em cena interessados ligados ao Governo, ao Museu Britânico, ao departamento de obras, entre outros. O que resultará em uma série de discussões sobre o destino do material encontrado no sítio arqueológico.
Filmada com grande apuro técnico, a obra faz lembrar um filme do Terrence Mallick sobre arqueologia. E confesso que a "homenagem", com a câmera fazendo idas e vindas em meio ao cenário pastoril, complementada pelas narrações em off, pelas plantações, pelo entardecer, pela chuva e pelo barquinho, com a fotografia da natureza verde-acinzentada sendo palpável - tudo elementos típicos do modus operandi do diretor de Uma Vida Oculta (2020) -, funcionam direitinho. É uma escolha acertada para uma obra que não requer pressa para evoluir, já que as próprias cenas da escavação em si, que sugerem certa delicadeza (observem o uso do pincel, de uma forma quase gentil), não exigem nenhum tipo de urgência. E mesmo os personagens acrescentados à narrativa, vão sendo colocados de forma tópica, orgânica, o que dá fluidez e organiza a obra para que nada pareça desconectado. É, ao cabo, o famoso filme que dá gosto de assistir.
Imprimindo, como já dito, força nos pequenos arcos dramáticos - um grave acidente que ocorre no sítio arqueológico, a severa doença de um dos protagonistas, a relação do filho de Edith com Brown (vivido pelo carismático Archie Barnes) -, a película aproveita o conceito de escavação para estabelecer uma metáfora com a importância da preservação da memória (e da história), cruzando-a com outros temas, como astronomia, fotografia, passagem do tempo e, claro, o absurdo da guerra. Discutindo, aqui e ali, temas como machismo, adultério e homossexualidade, a obra aposta na sutileza para fazer justiça ao nome de Basil Brown, que por muito tempo permaneceu como uma figura abnegada em sua área de conhecimento. Nesse sentido, o filme baseado no livro de John Preston, com toda a sua poesia subjacente, não deixa de ser uma bela homenagem.
Nota: 8,0
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