terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Cinema - Guerra Fria (Zimna Wojna)

De: Pawel Pawlikowsi. Com Joanna Kulig, Tomasz Kot, Adam Ferency e Borys Szyc. Drama / Romance, Polônia / Reino Unido / França, 2018, 88 minutos.

Ao nos fornecer pouquíssimas informações a respeito do contexto político/social da Polônia pós Segunda Guerra Mundial é possível inferir que Guerra Fria (Zimna Wojna) é aquele tipo de filme que acredita na inteligência do espectador. Silenciosa e de grande lirismo, ainda que eventualmente meio arrastada, a trama compreende um espaço de tempo que vai do ano de 1949 à 1964, mostrando as idas e vindas do músico Wiktor (Tomasz Kot) e da jovem Zula (Joanna Kulig), sua pupila e par romântico. De personalidades opostas - Wiktor é mais sisudo e pragmático ao passo que Zula é sonhadora e intempestiva - ambos se conhecem durante uma espécie de programa de Governo da Polônia comunista que, após o conflito, busca localizar talentos musicais e artísticos com o objetivo de resgatar e repaginar o arcabouço cultural e folclórico do País.

Naquele período, a Polônia integrava o chamado Bloco do Leste sob ocupação da União Soviética. Em resumo, o território estava anexado ao Pacto de Varsóvia com os russos, pode-se dizer, participando das decisões políticas do País. De certa forma tudo vai indo bem nessa triagem cultural até o momento em que os generais do exército vermelho resolvem influenciar nas escolhas artísticas de Wiktor. Em suma, para os líderes do Governo as canções apresentadas pelos grupos em teatros lotados poderiam também abordar temáticas sobre a luta do proletariado por direitos e sobre o ideal socialista - por mais que o assunto pouco apareça na música de "raiz" polonesa. É nesse momento que há uma ruptura: exilado, Wiktor vai à França onde se submete às pressões de mercado (ele precisa ganhar dinheiro) atuando como pianista ou até mesmo como produtor de trilhas sonoras para filmes.


Já Zula segue se apresentando e vai ganhando espaço em outras frentes e formatos - de forma que a distância entre ela e Wiktor não se torna apenas física já que, em suas "essências", ambos se modificam completamente com o passar do tempo, em um trabalho de composição de personagens formidável. Joanna, em especial, transforma a "camponesa simples e de nobre coração", de cabelos claros e modos contidos - vista no começo do filme - em uma femme fatale que se apresenta em bares, com peruca escura e roupas provocantes. A Guerra Fria - muitas vezes relacionada apenas aos Estados Unidos e à União Soviética - é também a metáfora para os desencontros do casal que, em um cenário completamente adverso, briga para ser feliz. Se encontra. Se desencontra. Se casa e namora com outras pessoas. Mas que mantém viva a esperança de uma paixão que, no fim das contas, nunca se consolida em sua plenitude.

E não é por acaso que o diretor Pawel Pawlikowski (que já ganhou o Oscar de Filme em Língua Estrangeira pelo igualmente belo Ida) realiza um trabalho estético que, propositalmente, acentua o clima de desconforto. Da irresistível fotografia bergmaniana em preto e branco (trabalho de Lucazs Zai, também nominado ao Oscar em sua categoria) à câmera parada e aos ângulos curiosos (repare na ampliação dos espaços, com rostos "mal" enquadrados, mesmo na proporção de tela 4:3), tudo parece contribuir para que haja uma sensação de deslocamento e de incerteza, o que é reforçado pelas elipses e pelos saltos no tempo abruptos, ainda que fluídos. É a obra de arte por definição, até mesmo em seu final redentor, com direito a uma frase ambígua e cheia de significados, que nos fará ficar pensando naquilo que assistimos enquanto os créditos sobem. É o único filme estrangeiro capaz de tirar o Oscar de Roma. O filme de Alfonso Cuarón é, também um primor. Mas não haveria injustiça.

Nota: 9,0


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