segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Cinema - A Favorita (The Favourite)

De: Yórgos Lánthimos. Com Olivia Colman, Rachel Weisz, Emma Stone e Nicholas Hoult. Drama, EUA / Reino Unido / Irlanda, 2018, 119 minutos.

É só nas aparências que A Favorita (The Favourite) talvez surja como o filme mais convencional do diretor grego Yórgos Lánthimos - que já nos fez "pirar a cabeça" com grandes obras como Dente Canino (2009), O Lagosta (2015) e O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017). Sim, não há novidade em apostar em uma trama de época, com figurinos luxuosíssimos, cenários deslumbrantes, desenho de produção impecável e figuras dispostas a todo o tipo de manipulação e mesquinharia para alcançar a tão sonhada ascensão social. Mas Lánthimos (re)constrói essa Inglaterra do Século XVIII bem a seu modo e, portanto, não serão poucas as personagens excêntricas, as sequências grotescas e a adoção de um estilo todo próprio de filmagem, capaz de levar à obra da absoluta normalidade filosófica ao delírio surrealista em questão de segundos. E, com isto em mente, a experiência se torna absurdamente divertida!

Na trama, Olivia Colman é a Rainha Anne. Com a saúde abalada, mas paparicada por Lady Sarah (Rachel Weisz) - espécie de amiga e conselheira -, a majestade não faz ideia de qual decisão tomar em relação à guerra que se espalha pela região. A chegada da jovem Abigail (Emma Stone) tornará o cenário ainda mais confuso. Apresentando-se inicialmente como uma figura humilde e disposta a auxiliar nas atividades do Reino, Abigail aos poucos mostrará a sua verdadeira faceta, quando começar a conquistar a confiança da Rainha. O que lhe possibilitará almejar um posto maior na corte. Evidentemente que este objetivo não será alcançado sem alguma dor ou sofrimento - e é neste ponto que entra o "toque" niilista do diretor: nada será simples (ou sutil) na relação entre essas três caricaturais personas. E o resultado dos embates entre elas não será menos do surpreendente!


Abusando do uso de lentes grandes-angulares - repare como os cantos dos cenários quase sempre estão arredondados - Lánthimos torna os cômodos do reino, naturalmente escuros, em ambientes absolutamente claustrofóbicos (e até mesmo sombrios, em alguns momentos). A nós, espectadores, resta a condição de observadores "participantes", que acompanharão cada estratagema desenrolado sem qualquer crise de consciência - e ainda por cima torcendo para que o caos se estabeleça! Retratando as figuras da côrte como uma massa totalmente alienada, o diretor utiliza a metáfora dos patos que participam de uma corrida (sim, pasme!) ou dos coelhos e sua capacidade de reprodução infinita, como uma rima para a estupidez claudicante das classes mais abastadas. Com a rainha batendo cabeça de um lado para o outro, incapaz de tomar qualquer decisão, e ainda cedendo aos caprichos da dupla de desafetas que luta pelo seu amor/amizade.

É um filme direto, mas ainda assim de grande riqueza visual, com trilha sonora pouco óbvia e criativo em suas resoluções - como atesta a sequência em que um tiro em uma pomba faz espirrar sangue no rosto de Lady Sarah que, mais tarde, inadvertidamente, sofrerá uma grave lesão no rosto. E que tem no seu trio de atrizes principais a sua grande força - e não é por acaso que as três estão indicadas para o Oscar desse ano, sendo Colman para a categoria principal, Weisz e Stone para a de coadjuvantes. Aliás, Colman está inacreditável como a Rainha que se despe de qualquer vaidade e que vai, da forma mais pessimista possível, entrando em um espiral de decadência que só a "falsa" sensação de poder é capaz de amenizar. A propósito, a cena em que ela aparece maquiada como um "texugo" ainda no primeiro terço é uma das grandes subversões do diretor, que apresenta uma obra convencional, mas que é capaz de romper justamente com as... convenções.

Nota: 8,5

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