segunda-feira, 18 de março de 2019

Pérolas da Netflix - Mais Uma Chance (Private Life)

De: Tamara Jenkins. Com Paul Giamatti, Kathryn Hahn, Kayli Carter, Molly Shannon e John Carroll Lynch. Drama, EUA, 2018, 127 minutos.

Querer engravidar e não poder é certamente o drama de milhares de casais mundo afora e o ótimo Mais Uma Chance (Private Life) trata deste tema com inteligência, bom humor e sensibilidade. Na trama Paul Giamatti e Kathryn Hahn vivem o casal Richard e Rachel que, na faixa dos quarenta e alguma coisa se esforçam para poder gerar um filho. Ligados as artes - ele é um produtor teatral, ela é uma escritora - sempre protelaram a ideia. Aliás, como muitas pessoas, desejavam primeiro ter uma casa, um carro, um cachorro, concluir projetos, ter estabilidade financeira... mas o tempo passou e a "idade limite" bateu na porta, bem como a dificuldade de engravidar. Após algumas tentativas frustradas de fertilização in vitro ou até de entrada em um sistema de adoção, o casal investe na busca de uma doadora de óvulos, como uma alternativa. Mas como fazer a escolha correta?

Inevitavelmente o desgaste gerado por essa situação - que exige grandes investimentos emocionais e financeiros - surge em doses cavalares a cada aparição melancólica de Richard e Rachel em cena (e quem já conheceu casais nessa situação, desejando MUITO terem filhos sem poder, sabe o quão devastador pode ser esta condição para o relacionamento). O "surgimento" da sobrinha Sadie (Kayli Carter), que vem morar com o casal em Nova York para estudar, renovará as esperanças dos protagonistas: bastante ligada a Richard e Rachel (que sempre lhe apoiaram), Sadie poderá ser a tão sonhada doadora. É uma jovem bonita, divertida, inteligente e que também é postulante a escritora. Mas como fazer a sua conservadora família - especialmente a mãe Cynthia (Molly Shannon) -, aceitar numa boa esta ideia?


A obra da diretora Tamara Jenkins (do excelente A Família Savage, de 2008), alternará momentos mais leves, com outros mais pesados, deixando o filme no limite entre o humor e o drama. Se em certa cena, Rachel questiona a real necessidade de se gerar um filho em um mundo em que há ascensão de grupos neofascistas (ou superpopulação), em outra ver o casal ser enganado por uma jovem que pretendia ser barriga de aluguel destes é não menos do que doloroso. Habilidosa na adoção de rimas visuais e metáforas, Jenkins não hesitará em compor sequências que tornam tudo ainda mais comovente, como no momento em que Richard e Rachel discutem algumas decisões no meio da rua, no mesmo instante em que passam por eles um grupo de crianças. O que também nos fará refletir sobre as reais "necessidades" de um casal para que este encontre a tão sonhada felicidade.

Nesse sentido, a película é absurdamente verossimilhante. Mesmo com comentários sociais divertidos e referências culturais - a cena em que Rachel cita a série The Handmaid's Tale é uma das melhores - a obra trata o tema de forma solene, sem apelar para piadas bobas ou maneirismos que diminuam a importância daquilo que assistimos. Não por acaso, a reação desesperada de Richard, após um episódio frustrante no consultório médico é totalmente crível - aliás, não poderia ser mais prazeroso assistir Giamatti e Hahn em cena, sempre competentes e dedicados em suas caracterizações (ainda que elas trafeguem no limite entre o excesso e a sutileza, nunca suas interpretações são caricatas, o que é comprovado pela maravilhosa sequência em que pedem ajuda a sobrinha). Ainda que eventualmente arrastado, o filme é cheio de méritos e joga luz sobre um tema pouco explorado pelo cinema, o que por si só já torna esse exemplar digno de atenção.

Nenhum comentário:

Postar um comentário