segunda-feira, 11 de março de 2019

Cinema - Todos Já Sabem (Todos Lo Saben)

De: Asghar Farhadi. Com Javier Barden, Penélope Cruz e Ricardo Darín. Suspense / Drama, Espanha / França / Itália, 2018, 133 minutos.

É muito provável que somente diretores com credenciais como as de um Asghar Farhadi tenham cacife pra reunir um elenco de nomes como Javier Barden, Penélope Cruz e Ricardo Darín no mesmo filme. O iraniano faturou DUAS VEZES o Oscar na categoria Filme em Língua Estrangeira nos últimos anos - pelos formidáveis A Separação (2012) e O Apartamento (2017) - e agora retorna com um projeto em língua espanhola, o que também dá conta de sua versatilidade. Não é o seu melhor filme, mas ainda assim, Todos Já Sabem (Todos Lo Saben) é uma obra acima da média. Aliás, bem acima da média. A trama é daquelas meio batidas, mas que sempre "diverte": a da reunião familiar em que um episódio extremo fará com que verdades, mágoas e segredos do passado sejam topicamente revelados ao espectador, num clima de tensão crescente, quase sufocante.

O "episódio extremo" é o desaparecimento súbito da filha de Laura (Penélope Cruz), durante a festa de casamento de sua irmã Ana (Inma Cuesta). Ninguém parece saber de nada e só o que os participantes lembram é do fato de que a moça bebeu bastante, antes de subir para o quarto da casa de campo alugada pela família para, logo depois, sumir. Como ocorre nesse tipo de trama, todos se tornam suspeitos - especialmente Paco (Javier Barden), antigo namorado de Laura, que se mantém próximo da família da ex, por questões "comerciais". Paco é viticultor e, na época que namorava Laura, comprou uma grande faixa de terras do sogro Antonio (Ramon Barea), aparentemente a preço de banana. Nesse sentido, questões relacionadas à propriedade privada e a ambição da classe média, podem estar por trás do sequestro da jovem. Podem, mas sem certeza de nada.


A trama parece meio novelesca (ou rocambolesca) e até é. Mas a narrativa se desenrola de forma fluída, com a família indo da euforia da "festa de casamento" para a devastação emocional motivada por um crime, em questão de segundos. A montagem é dinâmica, com pequenos saltos de um personagem para o outro, fazendo com que o espectador esteja atento a qualquer detalhe que possa denunciar o que de fato possa ter ocorrido. E as pequenas reviravoltas, com suspeitos inesperados e personagens secundários relevantes (como a de um policial aposentado disposto a ajudar), tornam tudo mais interessante. É o roteiro de suspense por excelência, com o espectador "preso" até o final, identificando ainda nas metáforas (como na do pássaro que não consegue sair de dentro do prédio da Igreja), uma estratégia interessante para discutir o componentes como o religioso, que é bastante presente.

E há ainda o trio de protagonistas que possui uma química incandescente. Penélope, especialmente, se despe das vaidades que envolviam papeis anteriores, para aparecer sem maquiagem, com cabelo desgrenhado e olhos marejados quase o tempo todo, em seu autoflagelo de mãe desatenta que vê a filha lhe "escapar" debaixo de seu nariz. Já Darin aparece mais na segunda metade, quando vêm da Argentina ao encontro de todos que estão na Espanha, transbordando vulnerabilidade e insegurança apenas com o olhar. Barden é aquele cara prático e firme nas suas decisões, transmitindo alguma ambiguidade em sua composição. E é simplesmente fantástico assistir aos três em cena, muitas vezes juntos, em papeis de grande carga emocional. Pena que a película de Farhadi sofra do mesmo mal de 90% das tramas de suspense: a dificuldade de fechar a história de forma satisfatória. É o único "pecadito" de um filme muito bom.

Nota: 8,0

Um comentário:

  1. As questões relacionadas a classe social são muito presentes no filme. Paco desconfia dos imigrantes colhedores de uva, ao mesmo tempo que é insultado por Antonio, seu ex sogro, por ser pobre e ter usurpado as suas terras. Um bom filme.

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