quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Tesouros Cinéfilos - Doentes de Amor (The Big Sick)

De: Michael Showalter. Com Kumail Nanjiani, Zoe Kazan, Holly Hunter e Ray Romano. Comédia romântica / Drama, EUA, 2017, 120 minutos.

Baseado em fatos reais, Doentes de Amor (The Big Sick) é aquele tipo de filme que vai te ganhando aos pouquinhos. Quando você começa a assistir você não dá nada pela obra e quando vê já está fascinado por ela, torcendo com todas as forças para todos os personagens - e por sua felicidade. E, levando-se em conta que esta é uma comédia romântica, bom, é possível dizer de saída que este já se consiste em um de seus tantos méritos. A trama nos joga para o universo em que convivem os comediantes de stand up, que tentam a sorte em bares e boates com meia lotação. Um deles, o paquistanês Kumail (Nanjiani), chama a atenção da estudante de psicologia Emily (Kazan, que, por sinal, é neta do grande diretor Elia Kazan). Após um flerte meio desajeitado (e cheio de tiradas bem humoradas), ambos percebem ter grande afinidade e, pra resumir a história, acabam se apaixonando.

Só que há um problema meio "Romeu e Julieta" nessa história. Por ser paquistanês, os pais de Kumail jamais aceitariam, de acordo com a sua cultura, o casamento com uma caucasiana. Ou com qualquer outra pessoa que não tivesse as suas origens. Não por acaso, alguns dos momentos mais divertidos da película mostram os esforços da mãe do protagonista - sua família também mora nos Estados Unidos - para lhe arrumar uma pretendente (já que a tradição no Paquistão são os casamentos arranjados). Por outro lado, é possível imaginar o tipo de preconceito - ou, minimamente, de desconfiança - que Kumail sofreria quando fosse apresentado aos pais, aos avós ou aos tios de Emily, uma garota loira, de olhos claros e integrante da família tradicional americana. O conflito, claramente, está estabelecido.



Só que Showalter, é preciso que se diga, jamais pesa a mão em sua abordagem, ainda que a película flerte com temas pesadíssimos, como preconceito racial e xenofobia - o que também passa pelo fato de não estereotipar (ao menos em excesso), o seu protagonista. Ao contrário, o diretor consegue rir da paranoia americana com o terrorismo, como no impagável primeiro diálogo entre Terry (Romano) e Kumail, ocasião em que o primeiro pergunta sobre as mortes ocorridas no 11 de setembro, para ouvir do segundo "é muito triste saber que perdemos 19 dos nossos melhores caras". Aliás, Romano claramente improvisa em várias cenas - talvez inspirado pelo clima dos bastidores -, tornando cada diálogo uma esquete particular e imprevisível, como no momento em ambos divagam, deitados em casa, sobre o amor. Já Holly Hunter está naturalmente hilária, compondo a mãe de Emily como uma figura ao mesmo tempo carismática, enérgica e carinhosa.

Reservando para o terço final o momento mais dramático da obra - Emily acaba acometida por uma infecção de difícil explicação - Showalter conta, assim, a história sobre como se deu a aproximação de Kumail com os pais de Emily e sobre como ambos conseguiram, assim, derrubar as eventuais barreiras culturais que pudessem impedir um relacionamento. E cada pequena conquista nesse sentido - vale também para a família do paquistanês - é celebrada pelo espectador, especialmente por aqueles que acreditam que, no amor, seja possível superar todas e quaisquer diferenças. Divertido, leve, eventualmente despretensioso mas, ainda assim, significativo do ponto de visto do atualíssimo debate, Doentes de Amor talvez merecesse uma melhor sorte no Oscar. Ainda assim a sua única indicação - na categoria Roteiro Original - não deixa de ser uma espécie de prêmio para uma obra assim, tão simpática.

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