quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Tesouros Cinéfilos - Caiu do Céu (Millions)

De: Danny Boyle. Com Alex Etel, Lewis Owen, James Nesbitt e Daisy Donovam. Comédia dramática / Fantasia, EUA, Reino Unido, 2004, 97 minutos.

O diretor Danny Boyle já fez tantas obras marcantes e distintas - Trainspotting (1996), Quem Quer Ser Um Milionário (2008) e 127 Horas (2010), só para citar algumas - que o singelo Caiu do Céu (Millions) até parece uma nota menor dentro da sua filmografia. Mas só parece, já que é absolutamente impossível permanecer alheio ou não se sentir tocado pela história dos dois irmãos que "encontram" uma mala de dinheiro com mais de duzentas mil libras esterlinas, próxima de um trilho de trem, apenas uma semana antes de a moeda inglesa corrente passar a ser o Euro. A história simples, edificante, leve e divertida, ainda que pudesse soar excessivamente demagógica no que diz respeito ao uso do dinheiro, acaba por nos emocionar de forma absolutamente naturalista, sem forçação, despertando em que assiste sentimentos relacionados a empatia, a generosidade e o espírito filantrópico. E que, no fim das contas, possibilitarão sonhar com uma vida mais harmoniosa em sociedade. Sim, em tempos de ódio, preconceito e intolerância, "sonhar" é a palavra.

O clima de "aventura infanto-juvenil" é reforçado pelo divertido fato de os irmãos terem personalidades absolutamente distintas. Enquanto Anthony (Lewis Owen) adota uma postura pragmática e até mesmo ambiciosa diante da situação - ele sempre está pensando diversas maneiras de, particularmente, se beneficiar da pequena fortuna, utilizando até mesmo a morte da mãe para se favorecer -, Damian (Alex Etel), com uma bondade quase inacreditável para um menino de apenas sete anos, está sempre analisando de que forma poderá beneficiar outras pessoas com o dinheiro, não hesitando em entregar parte dos recursos para causas sociais, para vizinhos mais pobres ou mesmo para amigos que terão o seu silêncio comprado. E essas diferenças de comportamento resultarão, inegavelmente, em alguns dos momentos mais engraçados da história - especialmente aqueles em que Anthony demonstra insatisfação diante da generosidade do irmão.



Ainda que pudesse soar como um elemento deslocado dentro do roteiro, o componente religioso - Damian recebe a visita de diversas entidades, santos e outros personagens bíblicos - serve apenas para reforçar o caráter fantasioso da película. Condição ampliada por outros eventuais exageros visuais e que contribuem para a constituição de um contexto lúdico e quase onírico da obra - repare como a mala de dinheiro que cai próxima dos meninos, quica de uma maneira totalmente irreal! Utilizando ainda uma paleta de cores totalmente diversificada, o diretor de fotografia Anthony Mantle é capaz de utilizar tonalidades mais quentes nas cenas que envolvem o amoroso pai dos meninos (o talentoso James Nesbitt) para, no instante seguinte, utilizar uma coloração mais saturada, em uma sequência que apresenta um flashback envolvendo a origem do dinheiro. (aliás, repare como este estilo de cores seria utilizado novamente mais tarde em Quem Quer Ser Um Milionário?, uma vez que Mantle retornaria para colaboração com Boyle também neste filme)

Com diálogos rápidos e divertidos, como no caso da cena da escola em que os meninos falam sobre os seus "heróis", sendo que a maioria deles são jogadores de futebol de algum clube de Manchester, a obra não poupa o espectador de momentos tocantes, como no caso do surpreendente reencontro dos meninos com a falecida mãe, em uma das sequências mais arrebatadoras da obra. E, como o filme é narrado pelo pequeno protagonista, é ele quem decidirá os rumos da história, que envolverão ainda a presença de uma assistente social (vivida pela atriz Daisy Donovan). E, como se não bastasse o deleite visual e o clima de feel good movei da película, o espectador ainda é arrebatado por uma sequência final ao som de Nirvana, do grupo new age Il Bosco, que está para sempre eternizada no coração de cada cinéfilo. Uma conclusão apaixonante, singela e que nos fará sair da sessão com o melhor dos sentimentos. E, ainda, digna de um dos melhores diretores de nossa geração.

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