terça-feira, 22 de novembro de 2016

Lado B Classe A - MGMT (Oracular Spetacular)

Neopsicodelia, indietrônica, new rave, synthpop... caracterizar o tipo de som ou a vertente em que se enquadra a dupla MGMT poderia até ser meio difícil há oito anos atrás, quando Oracular Spetacular foi lançado. Mas o ideal mesmo, especialmente para quem ainda não ouviu esse verdadeiro clássico moderno, é se deixar levar pelo som absolutamente saboroso da banda ignorando qualquer tipo de categorização. Sim, há uma boa quantidade de anos 80 ali no meio, com sintetizadores e teclados bem amarrados somados a efeitos e bleeps dançantes tão utilizados por grupos variados como New Order, Pet Shop Boys e outros tantos. Mas também há doses de funk, de rock, de música africana (ou com sua percussão tribal) e até de R&B, formando um conjunto capaz de dialogar com tudo ao mesmo tempo, sem abandonar a ideia de fazer música que possa ser facilmente consumida pelas massas.

Tenho a impressão de que quando Oracular Spetacular foi lançado ele não era esse disco todo. Pelo que me lembro ele foi mal recebido pela crítica. E o público, já naquela época meio saturado de bandinhas que queriam ser o hype da semana, talvez também tenha torcido um tanto o nariz. Ou não dado muita bola. Na verdade confesso que não sei se, hoje, mudou alguma coisa. Mas o caso é que uma revisão do álbum, que possui pelo menos três hits insuperáveis - Time To Pretend, Electric Feel e Kids - faz com que olhemos com carinho para aquele passado em que Spotify, Deezer e outras plataformas de streaming para a música não passavam ainda de sonhos distantes. A dupla Ben Goldwasser e Andrew Van Wyngarden lançou mais dois discos depois dessa estreia que, hoje, pode ser vista como surpreendente - Congratulations (2010) e MGMT (2013). Ambos, apesar de bons, passaram longe do impacto provocado por Oracular.


Ainda que não haja nenhum tipo de conceito - ao menos de forma clara -, o caso é que já começa com a capa. Em um cenário praiano, a dupla veste plumas e glow sticks e adota pinturas tribais como se estivesse pronta para um luau efervescente e litorâneo, repleto de cores de final da tarde. E a super lua ao fundo? Sim, se for o caso o registro possibilita, com a sua psicodelia dançante e multicolorida em meio aos vocais enfumaçados e atolados em sintetizadores, uma viagem para onde quer que se queira. Viagem, que pode ser literal ou não. Recomendável também seria acompanhar algumas canções com o videoclipe a tiracolo, já que a banda é especialista nisso. Kids, com sua letra absolutamente sincera e divertida sobre as angústias de se ter um filho - e de manter a postura orgulhosa, mesmo nos momentos mais detestáveis da paternidade - possui, sem sombra de dúvidas, um dos melhores clipes da história recente. Um pequeno filme de terror para os pequenos, diga-se.

Aliás, sinceridade nas letras parece ser a especialidade da dupla, que não se furta em falar de assuntos cotidianos, subvertendo a lógica estabelecida e retirando graça de onde, inicialmente, só seria possível encontrar tragédia. Se a especial Weekend Wars - com sua percussão marcante - é sobre superar dificuldades do dia a dia, The Youth é um hino sobre a juventude que se esvai. Já a niilista Time To Pretend, que abre o registro, poucas vezes foi tão honesta em relação a vida de um rock star, que pode apenas querer tocar, ganhar grana, escolher uma modelo gostosa pra casar, se entupir de cocaína e ter o carrão último modelo. This is our decision to live fast and die young / We've got the vision, now let's have some fun / Yeah it's overwhelming, but what else can we do? (É uma decisão nossa de viver rápido e morrer jovem / Nós fomos os visionários, agora vamos nos divertir um pouco / Tudo bem, é opressivo, mas o que mais poderíamos fazer?) pergunta a banda durante a ponte que leva a um dos mais arrebatadores refrões do disco.


Charmosamente descompromissada e abusando de certa displicência juvenil - até pra cantar, às vezes parece haver forte flerte com a desafinação - a dupla, que ao vivo e no estúdio se torna um grupo, com a adição de mais três integrantes, parece beber de fontes variadas que, muito provavelmente, integraram a formação musical de Ben e Andrew. Assim, não é difícil encontrar em cada curva do registro alguma citação a artistas tão variados como David Bowie, Toto, Prince ou Flaming Lips. Mas tudo feito com doses cavalares de personalidade e sem jamais soar como algo anacrônico ou fora de seu tempo. (e mesmo as semelhanças com contemporâneos modernosos como Arcade Fire, Vampire Weekend ou Animal Collective é capaz de colocar a banda em um cenário confortável que possibilitou certa renovação musical no início do milênio) Nesse sentido, independente de sua importância, o caso é que nós, aqui do Picanha, não cansamos NUNCA de ouvir o Oracular. Um verdadeiro Lado B Classe A.

Nenhum comentário:

Postar um comentário