De: Pedro Almodóvar. Com Juliane Moore, Tilda Swinton, John Turturro e Alessandro Nivola. Drama, Espanha / EUA, 2024, 107 minutos.
Vamos combinar que não é de hoje que Pedro Almodóvar vem numa toada mais melancólica em suas obras. Talvez seja a experiência. Ou o senso de finitude. O que faz com que suas produções mais recentes venham banhadas em momentos mais introspectivos - ou menos caricatos. Claro que os temas ligados à morte (e ao medo dela), à memória (coletiva ou não) e a busca por uma certa paz de espírito para seguir adiante, nunca deixaram de fazer parte dos seus filmes. Em meio às cores quentes e saturadas e aos dramas novelescos, essa consciência de que somos seres complexos, cheios de medos, desejos e traumas nem sempre bem resolvidos, sempre esteve presente. Mas é preciso que se diga que nos recentes Dor e Glória (2019) e Mães Paralelas (2021) parece haver um tipo de silêncio mais reinante. Que preenche espaços que, anteriormente, talvez fossem ocupados por barulhos histriônicos. Vai saber.
O caso é que essa impressão, proposital ou não, combina bastante com O Quarto ao Lado (The Room Next Door), que, baseado em obra de Sigrid Nunez, chega agora em diversas plataformas de streaming. Em entrevistas, o diretor chegou a mencionar a dificuldade que temos, como seres humanos, de falar a respeito da morte, por mais inevitável que ela seja "Não é natural que algo que esteja vivo deva morrer", comenta ainda na narração em off do início da projeção, a personagem Ingrid (Juliane Moore) uma escritora de best sellers que está em uma livraria, para a sessão de lançamento de sua nova publicação. Essa parece ser a deixa ideal para que, ali, naquele ambiente movimentado por fãs, uma antiga conhecida lhe dê uma notícia um tanto trágica: sua amiga Martha (Tilda Swinton), uma antiga colega de trabalho de quem ela meio que perdeu o contato, está com um câncer terminal.
Ingrid resolve visitar Martha. E é desse reencontro provocado por uma situação adversa que se estabelecerá um vínculo que determinará o futuro de ambas as mulheres. Sim, falando assim pode não soar tão interessante. Mas o que o diretor espanhol faz aqui é um pequeno tratado sobre estoicismo, esperança e autopiedade nos tempos atuais. Tempos, aliás, de avanço da extrema direita e de uma agenda antiambientalista que, de uma maneira bastante curiosa, se encaixará mais adiante na história. Especialmente após a aparição de Damian (John Turturro), um escritor que já teve algum tipo de relacionamento amoroso com ambas as mulheres no passado. Em suas recordações, em meio a momentos tristes e de euforia, Martha contará a Ingrid sobre como ficou grávida, no passado, de um jovem que foi para o Vietnã e que voltou traumatizado pela guerra - e com quem ela teve uma filha, Michelle, com quem ela perde contato após uma tragédia familiar.
[SPOILERS A PARTIR DAQUI] Já Ingrid se apresenta como a figura onipresente em um momento delicado para Martha que, desesperada em meio a tratamentos experimentais que dão errado e o receio generalizado de ter uma morte excessivamente dolorosa, faz uma proposta extravagante para a amiga: a de que ela lhe auxilie na condução de um processo de eutanásia, com pílulas que ela adquire na deep web. Para além de toda a complexidade ética ou os questionamentos morais que decorrem do fato, o caso é que Almodóvar coloca uma pulguinha atrás da orelha do público, em mais um tema considerado tabu em vários países do mundo: as pessoas deveriam ter o direito de simplesmente morrer, de forma confortável e assistida, se assim desejassem? Como se fossem criminosas, ambas alugam uma casa de campo meio escondida no Airbnb, para que a ideia amadureça. E claro que tudo isso será uma boa desculpa para mais uma experiência soturna, de humor torto e absolutamente cativante do espanhol.
Nota: 8,0
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