De: Karim Aïnouz. Com Iago Xavier, Nataly Rocha, Fábio Assunção e Fabíola Líper. Suspense / Drama, Brasil, 2024, 115 minutos.
Um noir tropical que mistura mato com neon, sensualidade com rigor, violência com fragilidade. Assim podemos resumir, em alguma medida, a experiência com Motel Destino, mais recente trabalho do diretor Karim Aïnouz (A Vida Invisível, 2019), que acaba de ser disponibilizado para aluguel nas plataformas de streaming. Exibido no Festival de Cannes desse ano, o longa acompanha o jovem Heraldo (Iago Xavier), um rapaz de 21 anos que sonha com uma vida melhor em São Paulo - longe, portanto, da costa nordestina -, mas que se vê envolto em uma tentativa de golpe que dá errado e que resulta na morte de seu irmão. Perseguido pelo bando da chefona Bambina (a ótima Fabíola Líper), após perder uma grana para uma prostituta, Heraldo encontra refúgio justamente no motel que dá nome ao filme e que é administrado pelo casal Dayana (Nataly Rocha) e Elias (Fábio Assunção).
A chegada é conturbada. Em fuga e sem ter muito pra onde ir, o protagonista aceita um trabalho temporário no local, como uma espécie de faz tudo - que faz pequenos reparos na estrutura, arruma os quartos, organiza os ambientes. O clima é meio caótico, em meio a gritos sexuais onipresentes e orgasmos constantes nunca abafados pelo sistema de isolamento acústico (que, na realidade, inexiste). Dia após dia, jovem vai ficando no local, passando a participar da vida do casal anfitrião: seus momentos de lazer, sua rotina, tudo envolve os três, que estão permanentemente com roupas mínimas (o calor é palpável) - e não demorará para que desejos até certo ponto controlados, explodam. E, bom, não é preciso ser nenhum expert para saber que, dado o temperamento imprevisível de Elias, as coisas podem sair do prumo rapidamente.
E, em linhas gerais, se esse é um thriller erótico que não chega a apresentar alguma grande novidade em sua narrativa - que flui com uma densidade meio enevoada, reforçada pelas cores vivas dos quartos temáticos do motel (com seus tons intrusivos e bastante saturados) -, por outro lado, esse é um projeto que nos propõe um mergulho em um universo pouco visto, como o dos bastidores de espaços procurados pelas pessoas exclusivamente para o sexo. Por trás de portas e janelas a libido constante gera uma sensação de calor que, alegoricamente, sufoca, causa estranhamento - um tipo de claustrofobia tensa, ansiosa, que vai no limite entre o tesão, o torpor e a violência. Não é por acaso que sequências com os animais domésticos (por assim dizer) mantidos por Elias, com sua sua selvageria prática e escancarada, funcionam como uma metáfora para os seres que ali habitam, com seu exagero ignóbil e sensualidade febril.
Nesse sentido, em alguma medida, a fuga de Heraldo para um lugar fechado em que ele, novamente, se verá preso, não deixa de ser uma ironia curiosa do roteiro. Envolto na rotina de sexo descompromissado e consertos de ar condicionado e de cerca elétrica, o protagonista vai levando a vida, desviando por corredores, em meio a prazeres fugazes de vermelho vívido - proporcionados pela experiente Dayana -, enquanto planeja algum tipo de fuga que nunca acontece. Os perigos rondam - inclusive com a presença inesperada de figuras ligadas ao bando de Bambina que veem no motel também um refúgio. Só que talvez o que Heraldo não perceba é que a liberdade suposta nesse local idílico e adequado para a putaria é que as portas poderão se fechar, inesperadamente. É tenso mas letárgico, potente mas cauteloso. Assim como costumam ser os bons filmes nacionais.
Nota: 8,5
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