Comprar o disco envolveu uma pequena epopeia que aliava a junção dos trocados necessários para a aquisição do registro e a torcida para que ele de fato EXISTISSE em uma loja do shopping local que, há muitos anos, já nem existe mais - e que certamente, na ocasião, estava mais interessada em comercializar os álbuns de alguma boy band. Com o sucesso na empreitada - os R$ 16,50 mais bem empregados DA VIDA - corri para casa para poder escutar o trabalho (na época lembro que o videoclipe de Karma Police já era figurinha fácil na programação da mesma MTV). Mas devo confessar que a experiência, inicialmente, não foi fácil. Quem conhece o OK Computer sabe que não se trata de um registro simples. O clima desalentador, as letras potentes (e, inicialmente, incompreensíveis), os excessos eletrônicos, a melancolia sôfrega, os refrões escassos... para alguém de 16 anos, definitivamente, aquela foi uma experiência difícil, mas transformadora. E que me fazia perceber algo diferente e a gostar mais do disco quanto mais eu insistisse em ouvi-lo!
Aliás, até hoje escuto o trabalho envolvido por um amontoado de sentimentos que me fazem não cansar nunca do álbum. Se hoje, para escutar música, basta dar um play no Spotify, no final dos anos 90 a aquisição de um CD qualquer de um grupo ou artista que amávamos representava uma espécie de conquista particular. E não foram poucas as noites em que peguei escutando o disco com um pequeno dicionário de inglês ao lado, com o objetivo de traduzir as letras metafóricas, irônicas, complexas e abundantes de sentidos. E que, hoje, me fazem perceber o quão genial era - e ainda é - Thom Yorke e companhia. Fitter, healthier and more productive / A pig / In a cage / On antibiotics canta o vocalista em Fitter, Happier, capaz de resumir de maneira completa o espírito de uma sociedade individualista, hedonista, niilista e alienada. (aliás, a canção "divide" o álbum e acaba funcionando como elemento central do fluxo de ideias previsto por Yorke para a concepção do trabalho)
O caos do cotidiano trazido por OK Computer pode ser resumido ainda por uma vida em que alienígenas, acidentes automobilísticos, yuppies que trabalham em busca do sonho americano, reações químicas, doenças, politicagem, capitalismo desenfreado, corações machucados, trabalhos que nos matam lentamente e feridas que não curam "convivem" permanentemente ao lado do homem, que parece o tempo todo lutar para sobreviver. O espírito anárquico das melodias - e dos elementos eletrônicos e de uso de instrumentos musicais pouco usuais - transforma o registro em um material riquíssimo do ponto de vista sonoro, nunca previsível e invariavelmente surpreendente. Tudo combinando com o trabalho gráfico apresentado pelo encarte, que provoca inquietação, instiga e nos faz olhar atentamente em busca de significados escondidos em meio a símbolos e ícones que transformariam qualquer aula de semiótica em algo muito mais divertido.
Como não poderia deixar de ser, o disco me fez perceber que o rock and roll podia oferecer muito mais do que os cabelos compridos, as camisas de flanela e os All Star de cano alto do grunge - que a algum tempo já definhava. Foi a partir de OK Computer que todos nós nos sentimos (é possível assim dizer) impelidos a descobrir outras bandas, grupos e artistas de cenas mais independentes ou alternativas, o que provavelmente forjou o gosto musical de uma geração inteira - e não é por acaso que o registro de Thom Yorke e companhia é colocado AO LADO de Nevermind, do Nirvana, como um dos mais importantes dos anos 90. A partir do trabalho o Radiohead atingiu outro patamar dentro da indústria da música. Bom para os fãs que encontrariam, mais adiante, um outro registro espetacular, chamado Kid A (2000). Mas essa, é outra história.
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