segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Novidades em Streaming - Belén: Uma História de Injustiça (Belén)

De: Dolores Fonzi. Com Dolores Fonzi, Camila Plaate, Julieta Cardinali e Laura Paredes. Drama / Policial, Argentina, 2015, 109 minutos.

"Em plena democracia em um hospital público Belén foi acusada, torturada e condenada na mesma noite.

Vamos combinar que, nos tempos políticos atuais, talvez não haja assunto mais divisivo do que o direito ao aborto. Se por um lado, a extrema direita fanatizada e de Bíblia debaixo do braço, quer, sob a desculpa da valorização incondicional da vida, obrigar até mesmo gestações resultantes de violências sexuais diversas - aliás, pouco importando se a vítima for uma adolescente ou, pior ainda, uma criança -, de outro, o campo progressista luta para que as mulheres possam ter meio que o básico. No caso o direito ao aborto minimamente em casos já previstos em lei - como em estupros ou aqueles que envolvem riscos médicos. A decisão, ao cabo deveria ser da dona do corpo - uma coisa tão óbvia que chega até a ser meio bizarro estar discutindo isso às portas de 2026. Esperávamos carros voadores nesse ano? Não, temos de brigar com a tal da bancada evangélica, preocupadíssima com os bebês - mas apenas quando eles estão nas barrigas das futuras mamães. Depois disso, que se explodam, né?

E é nesse contexto que entra Belén: Uma História de Injustiça (Belén) - o enviado ao Oscar 2026 pela Argentina, que está disponível na Amazon. Inspirado em eventos reais ocorridos em 2014, o filme de estreia na direção da atriz Dolores Fonzi narra o bizarro episódio ocorrido com a jovem Julieta (Camila Plaate) que, depois de dar entrada no hospital com fortes dores estomacais, é presa preventivamente, acusada de ter, deliberadamente, praticado um aborto. Levada pela polícia, ela aguarda durante dois anos por um julgamento pelo suposto crime de "homicídio agravado por parentesco" - tudo isso acontecendo após uma sequência revoltante em que policiais, como sempre investidos de certa síndrome do pequeno poder, invadem a ala hospitalar em que Julieta está, para lhe colocar algumas em plena maca do hospital. Sim, ela ainda está sangrando, com dor, agredida física e moralmente e está sendo presa. Sem provas, ainda por cima.

 


Após um salto no tempo entra em cena a destemida advogada Soledad Deza (a própria Dolores Fonzi), que promete auxiliar a garota, após descobrir que o caso teria uma série de incongruências - o que envolve a participação de uma defensora pública inescrupulosa, daquelas que prefere tomar decisões carregando uma cruz a tiracolo (e não a Constituição). Julieta está condenada a oito anos de prisão e o desenrolar da trama resultará em uma série de sequências de tribunal, com ótimos diálogos e um clima de tensão geral extremamente bem construído - que faz com que o espectador se conecte solidamente com a história. Em linhas gerais, o que a trama evidencia é que, quanto mais conservadora e provinciana for a cidade ou a região, mais complicado será evoluir em temas como este - e não demora para que a própria Deza passe a ser perseguida e intimidada, após seu nome chegar à imprensa (o que envolve uma participação em um programa sensacionalista e altamente cringe de TV, que tenta humilhá-la de todas as formas).

Nesse sentido e não por acaso, Julieta entra em uma espécie de conflito em relação ao fato de os motivos de sua prisão - que permanecem em sigilo -, chegarem à esfera pública, com movimentos coletivos ganhando força nas ruas e exigindo a anulação da sentença. E mesmo sofrendo uma grande injustiça ela teme represálias - como no caso do receio de que seus pais percam o emprego, ao descobrirem que sua filha teve um aborto. A sensação de certa desorientação, aliás, é ampliada com uma sequência de alucinações envolvendo sangue - como nas cenas do chuveiro (com a água funcionando como uma alegoria para a limpeza moral tão desejada). Sem ter vergonha de defender com clareza seu lado, mas sem soar excessivamente panfletária, Dolores consegue conferir complexidade às suas personagens. Ainda assim o que fica claro é que, mesmo em um cenário de democracia e de avanços sociais, políticos e culturais pontuais, esse é um tema que exige vigilância permanente para que não haja retrocessos. Especialmente frente à governos autoritários, ligados à extrema direita reacionária.

Nota: 8,0 

 

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