De: Diego Lerman. Com Leonardo Sbaraglia, Sergio Prina e Mónica Ayos. Comédia / Drama, Argentina, 2024, 102 minutos.
Em tempos de proliferação de notícias falsas - e de seu inegável caráter prejudicial para a vida em sociedade -, não deixa de ser meio ambíguo o sentimento ao assistir à comédia O Homem Que Amava os Discos Voadores (El Hombre que Amava a los Platos Voadores), obra de Diego Lérman que acaba de estrear na Netflix. Se por um lado há aquele charme tradicional do cinema dos hermanos, dos lugares, dos sotaques e do caráter excêntrico da história - sobre um sujeito que cria um verdadeiro circo midiático em cima de objetos voadores não identificados que simplesmente não existem -, não deixa de incomodar uma certa condescendência com o protagonista que, a despeito de tentar enganar a sua audiência, é tratado como uma espécie de anti-heroi carismático que, por conta de sua paixão pelo jornalismo (e pela TV), faz de tudo pra entreter.
Sim, se a gente conseguir prestar atenção apenas no componente lúdico da coisa toda, talvez seja mais fácil digerir a história inspirada em fatos reais de José de Zer (Leonardo Sbaraglia, que geralmente é ótimo, mas aqui parece meio caricato, talvez de forma proposital), um repórter de um pequeno canal de televisão dos anos 80, que vê a oportunidade de aumentar o ibope a partir de uma história sobre supostos fenômenos extraterrestres ocorridos no interior. Sabe quando surge no meio do pasto ou em um descampado uma daquelas manchas arredondadas misteriosas, que ninguém sabe muito bem explicar (até porque perguntar a um engenheiro agrônomo ou a um biólogo quebraria o encanto) e que "queimam" a grama? Tipo as do filme Sinais (2002)? É esse o ponto de partida da perseguição de der Zer, que vai até o local em que o fenômeno está acontecendo, na província de Córdoba, para entrevistar moradores e procurar evidências, na tentativa de comprovar a tese estapafúrdia.
Claro que a coisa começa pequena, mas diante do burburinho e do aumento nos números da audiência, o sujeito vê ali a oportunidade de dar uma de Chuck Tatum, o protagonista de A Montanha dos Sete Abutres (1951), encarnado com paixão desmesurada por Kirk Douglas. Só que enquanto no clássico de Billy Wilder o protagonista - um jornalista de caráter meio duvidoso -, leva a situação de um homem preso em uma caverna ao limite para garantir a audiência, aqui a manipulação, a chantagem e a personalidade invariavelmente mitômana do protagonista, são encaradas com uma leveza desconexa e uma graciosidade meio torta. Sim, muito provavelmente de Zer era esse sujeito capaz de dobrar as pessoas, seduzindo-as para aparições em gravações falsas, sensacionalistas e cheias de mentiras, mas ao ignorar o caráter nefasto da prática, o que possibilitaria um debate mais relevante sobre o tema, a obra fica apenas no rasinho.
Ok, eu entendo que nem toda a produção precisa ser um tratado antropológico e social da vida moderna - e aqui estamos falando dos anos 80 e basta lembrar como era a nossa própria televisão nos anos 90 (com direito a entrevista com falso PCC, logo depois da prova da banheira), para lembrarmos que a mentira e a engambelação pela audiência não é de hoje. Só que os tempos mudaram demais pra esse pano seguir sendo passado. Mentir sobre ETs inexistentes pode ser o ponto de partida para paranoias, teorias da conspiração e alienação cavalar - e eu não quero ser o xarope que fica procurando caso em comédia boba. Mas o fato é que esse sujeito existiu de verdade. E falseou notícia de verdade. Como jornalista de formação é meio difícil ficar indiferente. E só encarar como um entretenimento. Há pontos satisfatórios que bordejam os limites entre o real e a ficção - na própria parte técnica, com o flerte com o surrealismo e o aspecto abstrato da coisa toda. Só que não é suficiente. Ao dar voltas e voltas em torno de um pedaço de mato queimado que deveria ser ponto de pouso de alienígenas, o filme ainda por cima aborrece. E se estende mais do que o necessário. Uma pena.
Nota: 4,5
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