segunda-feira, 3 de março de 2025

10 Considerações Sobre o Oscar 2025

O Oscar 2025 ocorrido na noite de ontem fecha oficialmente a temporada de premiações iniciada no ano passado e, aqui no Picanha, também passamos a régua com as nossas considerações. Ainda de ressaca, ainda fazendo festa, ainda estando aqui celebrando esse momento mágico vivido pelo nosso cinema na noite de ontem!

 


1) Vimos a história acontecer! Nunca antes em 97 edições do Oscar havíamos assistido ao Brasil vencer a categoria Filme Internacional e ver a Penélope Cruz anunciando a nossa conquista foi incrível. Que a vitória de Ainda Estou Aqui tenha ocorrido no mesmo final de semana do Carnaval só pode ser a prova de que Deus existe e é brasileiro. Mais importante: só fomos nos tornando favoritos (em partes) conforme o tempo passava e a nossa campanha evoluía - e Emilia Pérez, o candidato francês, derretia (por conta de todas as polêmicas envolvendo a Karla Sofía Gascón). Uma campanha que teve, sim, grana da produção, mas teve muito boca a boca, muita sessão comentada, muito evento de apresentação mundo afora. Foi a forma encontrada para que os votantes tomassem conhecimento da obra. O que foi fortalecido pela vitória da Fernanda Torres no Globo de Ouro.

2) Importante, pessoal: copo MUITO cheio nessa conquista. Sei que muita gente ficou triste ou frustrada porque a Fernanda não faturou a estatueta dourada na categoria Atriz, mas, verdade seja dita, ela nunca foi uma favorita. Favorita, favorita MESMO, era a Demi Moore, por seu trabalho irretocável em A Substância. Com as vitórias nas prévias o cenário parecia bastante consolidado. Mas o caso é que, na reta final da campanha, os votantes meio que abraçaram oficialmente Anora como uma espécie de queridinho, concedendo a ele cinco prêmios. Entre eles Filme, Roteiro Original e Direção. 

3) Em tempo e ainda sobre a vitória do Brasil: ela chega em ótima hora, primeiro porque chama a atenção do mundo para um problema que tem assolado diversos países (e que envolve a ascensão das ditaduras militares de extrema direita e seu belicismo antidemocrático), e segundo pela oportunidade de dar uma maior visibilidade à nossa produção cultural, artística e fílmica para os próximos anos. Usando um jargão meio que de mercado, vencer o Oscar pode nos tornar um player mais significativo em termos de cinema, o que talvez nos torne presença mais recorrente em premiações mundo afora. Não apenas no Oscar, mas em Cannes, Veneza, Berlim e outros. Aliás, recentemente, e só pra ficar num exemplo, o ainda inédito O Último Azul, de Gabriel Mascaro, levou o Urso de Prata em Berlim e já desponta como um possível candidato para outras premiações durante o ano.

4) Voltando à categoria Atriz, penso ser importante não reduzir a vitoriosa Mikey Madison, a uma jovenzinha em um "filme de prostituta". Primeiro, que Oscar não é apenas relevância, senão todos os anos documentários sobre temas políticos e sociais venceriam as categorias máximas da noite. É campanha. É boca a boca. E, sim, também é lobby. Madison está perfeita em um papel dificílimo e extremamente físico, corporal (assim como era o da Demi). Ou vocês acham que aquelas cenas de sexo são fáceis de fazer? Ou as que envolviam longas discussões? É um trabalho grande e que, vá lá, tem seus méritos. Claro que aqui éramos sim, team Nanda, mas acho que pra Demi a dor é maior. Certamente o discurso antietarismo na indústria estava pronto e, ironias das ironias, ela foi perder o Oscar justamente pra uma garota de vinte e poucos anos. É pra render debates e teorias na mesa de bar.

5) Quem estava atento ao componente político, para além do artístico, pôde constatar que esse foi um Oscar que fez uma série de acenos e piscadelas à minorias diversas - estrangeiros, negros, LGBTs e outros. Sim, o apresentador Conan O'Brien pode não ter citado diretamente o governo Trump e toda a barbárie produzia por esses lunáticos da extrema direita, mas foi no transcorrer da premiação que vieram algumas respostas aos absurdos do laranjão. Como exemplo, podemos citar a vitória da animação Flow, que desbancou a Pixar (e seu Divertidamente 2) ou outras produções mainstream como Robô Selvagem. Aliás, Flow também deu à Letônia o seu primeiro Oscar da história, em sua primeira indicação. Um filme sem diálogos, com baixíssimo orçamento e feito com recursos modestos. Foi um instante bonito.

6) Outros momentos comoventes e com acenos aos imigrantes e a seu árduo esforço para colocar suas obras de arte no mercado, foram as vitórias do curta em Animação iraniano In the Shadow of the Cypress (e foi muito emocionante ver o pessoal da produção afirmando que até o dia anterior não tinha conseguido o visto pra chegar aos Estados Unidos) e do documentário No Other Land, uma produção Palestina sobre resistência do povo frente ao absurdo do deslocamento forçado de um povo por tropas israelenses. De forma complementar é possível ainda citar o Paul Tazewell, que se tornou o primeiro figurinista negro da história a vencer em sua categoria, por Wicked. E se não me engano ele também é gay.

7) uma coisa importante sobre Anora, galera: é muito legal ver um realizador saído do cinema alternativo e com grandes obras no currículo - como Projeto Florida e Red Rocket -, como o Sean Baker, dando também visibilidade pra esse cinema menos espetacularizado e pautado por grandes efeitos ou uso de inteligência artificial (polêmica que rondou O Brutalista, por exemplo). Fora o fato de que Baker foi o rei do carisma na noite, subindo ao palco trocentas vezes, já que ele não apenas dirigiu como editou, roteirizou e montou o filme! Dá uma escala 5x2 pro homem, por favor!

8) Sobre O Brutalista, Hollywood sempre gosta de uma história de ascensão, queda e volta por cima em termos de carreiras de atores e atrizes e foi legal ver o Adrien Brody, que andava relegado a uma espécie de segunda divisão das escolhas de papeis, de volta à linha de frente (lááá atrás, ele tinha faturado o carecão dourado por O Pianista). Ele aparece com mais ou menos umas duzentas horas de tela no interminável filme de Brady Corbet. Um papel de exigência.

9) Kieran Culkin e Zoe Saldaña eram as barbadas da noite, nos bolões mundo afora. A Verdadeira Dor e Wicked podem até ser filmezinhos qualquer nota, mas, Oscar, não é tanto sobre qualidade. No caso de Kieran seu papel tem aquele quezinho de Oscar bait que a Academia adora (ainda mais com ele dando meio que uma reprisada nos trejeitos do sujeito atormentado já visto em Succession). 

10) Em resumo, galera, foi um Oscar histórico pra nós, dinâmico, que passou voando e que nos reposiciona nesse mercado. Ano que vem tem mais e eu tenho certeza que com o olhar ampliado sobre nossa produção, temos chance de emplacar novamente uma short list. É cedo ainda! Mas o sonho não para, afinal, como diz a nossa diva, "a vida presta e MUITO!"

 

E, chora, Emilia Perez, filme horroroso que se torna o maior perdedor da história, com onze estatuetas não entregues!

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