terça-feira, 28 de dezembro de 2021

10 Melhores Leituras de 2021 (+5 Menções Honrosas)

Diferentemente do que ocorreu em 2020, quando a pandemia - à época, uma dolorosa "novidade" - nos obrigou a ficar em casa, neste ano o volume de leituras foi um pouco menor. O que não nos impediu de tomar contato com grandes obras, de escritores nacionais e estrangeiros. Aliás, como comprova a nossa última listinha do ano - a das 10 Melhores Leituras de 2021 e mais cinco menções honrosas -, o período foi produtivo para os autores brasileiros, que entregaram grandes obras que deverão permanecer na memória, especialmente por refletirem os duros tempos que vivemos. Claro, nunca é demais lembrar que os livros que constam nessa relação não foram necessariamente lançados nos últimos 12 meses. Ainda assim procuramos privilegiar algumas novidades, como forma de chamar a atenção para o que tem sido feito na produção atual. Boa leitura!



Menções honrosas:

15) Encontro com Rama (Arthur C. Clarke)

14) A Visita Cruel do Tempo (Jennifer Egan)

13) O Riso dos Ratos (Joca Rainers Terron)

12) A Tensão Superficial do Tempo (Cristóvão Tezza)

11) Recursão (Blake Crouch)


10) As Intermitências da Morte (José Saramago): E se a Morte paralisasse as suas atividades? Resolvesse, de um dia para o outro, descontinuar o seu trabalho. Uma espécie de greve. Sem aviso prévio. A gadanha pendurada em um canto. O corpo esquelético em repouso. Um fato absolutamente contrário as normas da vida, daqueles de causar uma perturbação enorme nos espíritos. Um fenômeno nunca antes visto nos quarenta volumes da história universal - no caso 24 horas sem que se tivesse sucedido um falecimento que fosse por doença, por queda mortal, por suicídio. Nem um acidentezinho de trânsito - uma daquelas trágicas irresponsabilidades que povoam as estradas. Como reagiríamos a essa inesperada suspensão? Como procederíamos diante da imortalidade, convertida agora no "novo normal"? Pois é justamente isso que José Saramago imagina nessa fábula lançada em 2005 e que funciona como uma ampla divagação sobre finitude, sobre vida e, creiam, até sobre amor. Leia a resenha completa.


9) A Porta (Magda Szabó): uma das grandes obras da literatura húngara A Porta nos joga para o cenário pós-Segunda Guerra Mundial, onde uma escritora erudita contrata uma vizinha para ser sua governanta. Com personalidade diametralmente oposta a sua, Emerenc, a empregada, é uma figura misteriosa, taciturna, uma camponesa analfabeta, eventualmente rude e que mora sozinha em uma casa de ares modestos. E como se não bastasse o seu perfil reservado, Emerenc ainda mantém um excêntrico hábito: o de impedir qualquer pessoa de adentrar a sua residência. Em resumo: ninguém passa pela sua porta. E é justamente esse mistério que angustiará a existência da patroa que, em meio a um mosaico de situações cotidianas envolvendo a vizinhança, fará de tudo para tentar descobrir o que esconde a governanta. Quem é afinal essa mulher e porque ela mantém uma postura fechada em relação ao universo que a rodeia? É o que essa joia tentará responder, numa escrita vigorosa, poética e cheia de simbolismos.


8) Os Supridores (José Falero): poucas vezes a literatura brasileira foi tão simples, direta e vertiginosa como no caso do romance de estreia do gaúcho José Falero. Com ares autobiográficos, a trama conta a história dos jovens Pedro e Marques, que trabalham como repositores em um supermercado de Porto Alegre. Um emprego, como não poderia deixar de ser, precarizado, em que as exigências (e as humilhações) são muitas e o salário é pouco. Entre os dois Pedro é o mais intelectualizado, capaz de ter uma leitura mais ampla do cenário que os rodeia e assim utiliza a sua habilidade com as palavras para convencer Marques - um sujeito mais intempestivo, de personalidade forte - a montar um esquema de comercialização de maconha no bairro em que moram. A partir de então o leitor acompanha de perto, e com um realismo pungente, todas as etapas que envolvem as negociações, tendo como pano de fundo profundas discussões sobre desigualdade, sobre racismo e sobre superação. É simplesmente imperdível.


7) Sobre os Ossos dos Mortos (Olga Tokarczuk): nesse romance polonês que propõe uma deliciosa mistura de estilos - a obra vai do suspense policialesco, passando pelo realismo fantástico até chegar à comédia de humor negro, muitas vezes na mesma página - somos arremessados a um vilarejo em uma gelada região ao norte da Polônia, na divisa com a República Tcheca. É nesse local frio, inóspito - o sentimento de desolação por vezes é palpável -, que mora a protagonista Janina Dusheiko, uma professora de inglês aposentada, que ocupa suas horas como caseira em propriedades vizinhas à sua. Atividade que lhe garante uma renda extra, ao mesmo tempo que permite monitorar a movimentação no local. Só que a tranquilidade é quebrada quando Janina é surpreendida pela morte de seu excêntrico vizinho. Com um estilo de escrita direto, sem firulas, Sobre os Ossos dos Mortos é subversivo, existencialista e um tanto macabro, propondo uma série de reflexões sobre a nossa relação com a natureza. Leia a resenha completa.


6) Norwegian Wood (Haruki Murakami): a moda de outros escritores que espalharam dilemas, incertezas, anseios e inseguranças do universo juvenil em suas páginas - casos de J. D. Salinger em O Apanhador no Campo de Centeio e F. Scott Fitzgerald em O Grande Gatsby, pra ficar em apenas dois exemplos -, aqui, Murakami parte de um evento trágico (no caso o suicídio de um adolescente de 17 anos) para revirar as memórias daqueles que ficaram: no caso, o protagonista Toru Watanabe, que era melhor amigo do jovem e a bela Naoko, a ex-namorada do falecido. Um reencontro entre os dois despertará uma paixão bem ao estilo das paixões adolescentes: difusa, muitas vezes complicada e, neste caso, ainda preenchida por uma espécie de dilema ético. Acolher a ex-namorada do melhor amigo pode ser uma fuga nesse momento. Mas desejá-la como como Watanabe nunca desejou nenhuma outra, será o certo? Com um sem fim de referências culturais a obra não nos dará respostas fáceis. Especialmente em relação a perguntas complexas, como o que fazer da vida, quando ela avança inexoravelmente? Leia a resenha completa.


5) Baixo Esplendor (Marçal Aquino): s
e existe uma coisa que me fascina na obra do Marçal Aquino é o fato de ele pegar aquele Brasil urbano, violento, excessivamente hostil e nos fazer ele escorrer de uma forma absurdamente fluída das páginas de seus livros. É nessas obras que a gente vê escancarado o Brasil dos contrastes, dos malandros, das traições, do submundo. Do jeitinho brasileiro. De tentar fazer dar certo aquilo que, no nosso íntimo, a gente sabe que não vai dar. Aqui, o pano de fundo é o da Ditadura Militar brasileira, ano de 1973. Há uma tensão palpável que está no ar, em meio ao fluxo modorrento de opalas e fuscas, que se alternam pelas avenidas das grandes capitais, contexto em que um tira se infiltra em uma quadrilha de ladrões de cargas e, durante a operação, vê as fronteiras entre sonho e realidade borradas, quando se apaixona pela irmã do chefe do bando. É um caso de amor movido a sexo e fadado ao desastre, que será levado até o limite nessa obra irresistível, rápida e caudalosa, e quase impossível de largar. Leia a resenha completa.


4) A Máquina de Fazer Espanhois (Valter Hugo Mãe): a inevitável chegada da idade e o avanço cruel do tempo são a matéria-prima para uma das mais comoventes obras do escritor português Valter Hugo Mãe. Na trama somos apresentados ao protagonista António, um barbeiro aposentado de 84 anos, que é levado pela família para viver num lar de idosos. Em meio ao processo autocomiserativo do fato em si - e da repulsa automática que passa a sentir por seus entes "não tão queridos" -, o sujeito tentará se adaptar a sua nova realidade, aos funcionários que ali estão e a uma existência em que a convivência com os demais pacientes será, muito provavelmente, o único caminho. De forma quase cruel, Mãe analisa essa dolorosa e solitária etapa da vida com senso de humor e sensibilidade surpreendentes, nos apresentando um coletivo de personagens cativantes, carismáticos e até imprevisíveis. Como a flor que fura o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio, a prosa trágica e cômica do escritor busca, na humidade dos que padecem, material para louvar a vida. Não é pouco.

3) As Brasas (Sándor Márai): existem alguns livros que são tão poeticamente escritos, tão soberbamente costurados, que parecem tornar a narrativa maior do aquilo que se vê nas aparências. E é esse justamente o caso desse clássico do húngaro Sándor Márai. Cronista perspicaz, o autor nos apresenta uma história sobre amizade, paixão amorosa e honra. No romance dois amigos de infância, Henrik e Konrad, não se vêem há 41 anos, depois de um deles desaparecer misteriosamente em 1899. Após a chegada de uma carta ao castelo localizado nos Montes Cárpatos, o velho general do Império austro-húngaro Henrik prepara o local para a visita do amigo que não encontra há quatro décadas. Está claro que entre os dois há feridas jamais curadas - e que podem ter a ver com o, agora fantasma, de Kriztina, mulher que ambos teriam disputado no passado. Ainda há espaço para a retomada desse duelo, após tantos anos? Com total domínio narrativo, Márai converte As Brasas em um romance tão sombrio quanto panegírico, que representa ainda de forma impecável a aristocracia da época.


2) O Avesso da Pele (Jeferson Tenório): um dos mais impressionantes romances lançados em 2020, o livro do carioca radicado no Rio Grande do Sul Jeferson Tenório narra a história de Pedro que, após a morte do pai em mais um "caso isolado" de desastrosa abordagem policial, sai em missão para resgatar o passado da família, refazendo os caminhos paternos. Alternando momentos poéticos, com outros da mais completa brutalidade, o autor traz à tona um País marcado pelo racismo institucional e pela completa incapacidade do Estado - especialmente no contexto de um governo autoritário, perverso e que parece se orgulhar de flertar com o fascismo, como este que vivemos. Nesse sentido trata-se de uma ficção atualíssima, tão sensível quanto dolorosa e que possibilita uma reflexão sobre temas como identidade negra, preconceitos, intolerância e o processo quase permanente de segregação em nossa sociedade. É um livro potente, escrito escrito com habilidade e que articula a complexidade das relações familiares (e suas tragédias) de forma quase ritualística.


1) Solução de Dois Estados (Michel Laub): É o Brasil polarizado na sua essência que nos é apresentado no mais recente romance do gaúcho Michel Laub. Nas páginas do livro, o ódio que divide também as famílias é materializado na experiência antagônica que envolve os irmãos Alexandre e Raquel. Jamais estereotipados, ainda que ricamente caracterizados, os dois funcionam como uma espécie de case para uma certa Brenda Richter - documentarista alemã que centra a sua lente para os países do Terceiro Mundo, bem como para as suas mazelas, diferenças sociais, contrastes. As questões políticas e a beligerância por trás de cada manifestação de cunho ideológico também pontuam cada obra da diretora. Jamais a questão é tratada de forma aberta, mas o Brasil que "iniciou" em 2018 - aquele mesmo que odiou perdidamente o PT (e a esquerda) e alçou um genocida desqualificado ao poder -, aparece em cada página. Em cada linha. Nos detalhes de cada relato, nessa obra que não encontra na ideia de conciliação, a saída para a barbárie que nos enfiamos. Leia a resenha completa.


Pessoal, espero que tenham curtido as nossas listas! Final do ano que vem tem mais. E não esqueçam de comentar, curtir, compartilhar. E de também eleger os seus melhores do ano!


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