De: Potsi Ponciroli. Com Tim Blake Nelson, Gavin Lewis, Stephen Dorff e Scott Haze. Faroeste, EUA, 2021, 99 minutos.
O gênero faroeste pode até não existir mais nos moldes que consagrariam diretores como John Ford ou astros como John Wayne. O que não significa que não exista uma ou outra obra na atualidade, que cumpra bem o seu papel - e este é o caso do recém-lançado para aluguel em streaming Retorno da Lenda (Old Henry). Aqui temos um filme do estilo por excelência, a começar por seu protagonista Henry McCarthy, vivido por Tim Blake Nelson. Sujeito taciturno e resiliente, ele toca uma propriedade em Oklahoma ao lado do filho, o destemido Wyatt (Gavin Lewis), que não suporta a lida no campo e não vê a hora de abandonar aquele projeto de vida. Num dia de rotina de trabalho, a dupla avista no alto do morro um cavalo que cambaleia solitário. O animal está selado, há manchas de sangue em seu pelo. Ao sair pra investigar o entorno, Henry descobre um homem gravemente ferido. Perto dele há também uma pistola. E um saco de dinheiro.
Henry recolhe tudo: homem ferido, pistola, saco de dinheiro. Esconde qualquer pista do local e retorna para casa. Não faz ideia do que se trata aquilo tudo. Mas é possível ler a preocupação em seu olhar. Tanto que exige do filho o máximo de cautela como um todo. Aliás, esse é o tipo de coisa que irrita o jovem Wyatt. Seu pai parece ser tão superprotetor, que sequer lhe deixa segurar uma pistola. Muito menos manuseá-la. Há um claro desconforto no comportamento misterioso de Henry - e a interpretação de Blake Nelson, que parece ter nascido pro papel (especialmente após o hilário segmento inicial de A Balada de Buster Scruggs, dos Irmãos Coen), contribui para que se instale um senso de tensão permanente. Claramente há segredos do passado que o homem se esforça para que não venham à tona. Traumas, talvez. Que não parecem dialogar com a tentativa de levar uma vida simples como agricultor no Sul dos Estados Unidos.
E tudo piora quando o home ferido - seu nome é Curry (Scott Haze) - desperta. E se apresenta como um xerife que atua nas redondezas. A relação dos dois é inicialmente truncada. Henry ajuda a retirar a bala que está alojada no peito de Curry (uma sequência intensa, visual). Tendo nesse contexto uma oportunidade para aproximação, para saber mais, para investigar. A confiança entre os homens aos poucos vai se estabelecendo, especialmente quando ele revela ser um dos únicos sobreviventes de um confronto com um grupo de perigosos bandidos, no passado. Não demora para que um trio com cara de "poucos amigos" chegue até a propriedade, perguntando por Curry. O líder, um certo Ketchum (Stephen Dorff) garante também ser xerife na região, alegando o fato de Curry ser um fora da lei que está sendo procurado por crimes diversos. É uma negociação difícil e, bem, a gente sabe que esse tipo de encontro, num filme de faroeste, não costuma terminar bem.
Claro que a "diversão" aqui está em tentar identificar quem está falando a verdade e quem está mentindo nesse jogo. Curry é de fato um xerife? Ou é alguém que mente apenas para se aproximar de Henry na intenção de levar algum tipo de vantagem? E o estilo impetuoso e meio desatinado de Wyatt não pode colocar todos ali em risco? E quais as reais intenções de Ketchum e sua gangue? Alternando momentos mais silenciosos e reflexivos - com belas paisagens -, com outros mais movimentados, com direito à tiroteios à moda clássica, o diretor Potsy Ponciroli constroi Retorno da Lenda como uma espécie de tributo justamente a essas figuras clássicas e arquetípicas que contribuíram para a formação do oeste americano - fossem eles pistoleiros, criadores de gado, xerifes ou outros integrantes desse imaginário. Os conceitos de mocinho e bandido são burlados nesse contexto, que decorre ainda de ótimas surpresas do roteiro e das excelentes e ambíguas caracterizações. Não é uma experiência inesquecível ou vibrante ao extremo. Mas trata-se de um bom passatempo. Que, de quebra ainda foge um pouquinho do óbvio.
Nota: 7,5