terça-feira, 28 de outubro de 2025

Novidades em Streaming - Éden (Eden)

De: Ron Howard. Com Jude Law, Ana de Armas, Siney Sweeney, Daniel Brühl e Vanessa Kirby. Suspense / Aventura, EUA / Austrália, 2025, 129 minutos.

Eu preciso ser honesto com vocês: um filme como Éden (Eden) deve ter um amontoado de inconsistências, pouca coisa deve fazer sentido do ponto de vista histórico e há uma grande chance de que não haja qualquer pé na realidade. E, ainda assim, trata-se de uma experiência cinematográfica irresistível, divertida, tensa e sexy - capaz de nos deixar meio que hipnotizados pelas mais de duas horas de duração. Dirigida por Ron Howard - que tem uma carreira irregular, marcada por clássicos modernos oscarizáveis, como, Apollo 13 (1995) e Uma Mente Brilhante (2001) e por bombas atômicas como o recente Era Uma Vez Um Sonho (2020), a obra se inspira na história real do casal Friedrich Ritter (Jude Law) e Dore Strauch (Vanessa Kirby) que fogem da Alemanha no pós Primeira Guerra, para viver na pequena Floreana, um ponto isolado da Ilha de Galápagos.

A ideia era meio que abrir mão dos valores burgueses e capitalistas que pareciam estar corroendo o tecido social, para viver uma espécie de utopia de comunhão com a natureza, em uma nova vida bem distante do mundo "civilizado" e livre de qualquer amarra moderna. Na companhia apenas dos sons da mata e da praia do entorno, Ritter, que era médico, encontrava bastante tempo para se sentar diante de sua máquina de escrever, na intenção de compor uma série de manifestos que encontrariam espaço em jornais estadunidenses e europeus. E é mais ou menos aí que iniciam-se os problemas do casal, com outras pessoas buscando esse espaço idílico, como no caso dos agricultores Margret e Heinz Wittmer (Sidney Sweeney e Daniel Brühl), que chegam ao local com o filho tuberculoso Harry (Jonathan Tittel); além da excêntrica e hedonista baronesa Eloise Wernhorn (Ana de Armas), que chega com seus servos na intenção de construir um resort de luxo no local.

 

 

Uma rápida pesquisa na internet nos permitirá saber que todas essas pessoas, de fato, existiram e, muito provavelmente, coabitaram o local ao mesmo tempo. Mas o que Howard parece desejar fazer, aqui, é nos lembrar de certos ideais um tanto niilistas, baseados em figuras como Nietzche ("quem quiser permanecer limpo entre os homens, deve aprender a banhar-se em águas sujas") ou filósofos como Sartre ("o inferno são os outros"), que são citados de forma permanente e quase presunçosa por Ritter - como uma espécie de metáfora fragmentada do todo. Porque ao final e ao cabo, o casal não consegue deixar a civilização pra trás, sem que ela o encontre. E junto com ela, todos os preconceitos, mentiras, manipulações e antagonismos. Com uns se colocando contra os outros em disputas territoriais - por água, por comida, por poder (e até por prazer) -, o que nos faz lembrar as crianças perdidas do clássico literário O Senhor das Moscas (1954).

Quando os Wittmer chegam, Ritter não acredita que eles tenham força pra permanecer. Há muitos perigos ali e uma série de exigências de sobrevivência que parecem inadequadas para forasteiros. Mas eles ficam, persistem, constroem uma boa horta e se estabelecem com muito trabalho - a despeito dos olhos sempre tristes de Margret, que descobre estar grávida na ilha (o que renderá uma das sequências mais tensas do longa). Já a baronesa é absolutamente irresistível com o seu apelo à luxúria e consumo desenfreado, como uma pequena burguesa autoritária e cheia de personalidade, que antagoniza a todos ali, especialmente ao anunciar ser meio que a dona da ilha. Como um microcosmo da própria falência do capitalismo tardio, o filme consegue ser engraçado e reflexivo ao mesmo tempo, alternando momentos de diálogos hilários (a cena do almoço ou a da tentativa de sedução à um figurão de Hollywood são imperdíveis), com outros repletos de ressentimentos e de uma quase inevitável escalada da violência. Eu tenho a impressão de que se esse filme tivesse sido lançado na década de 90, ele seria sucesso absoluto. Talvez até sendo lembrado nas premiações. Hoje em dia, as pessoas parecem menos dispostas à papagaiadas escapistas. Tudo é levado a sério. Mas quem se aventurar sem grandes pretensões, deve se divertir.

Nota: 7,0 

 

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