Pode até parecer meio batida a ideia de imaginar uma história que de conta do surgimento da lenda do Papai Noel, mas o filme Klaus (Klaus) faz isso te uma forma tão simples e tocante, que é simplesmente impossível não se emocionar. É o tipo de obra nostálgica, que vai fundo na nossa memória afetiva e que deixa, não é exagero, todo mundo as lágrimas no final da sessão. Aliás, talvez essa seja a animação favorita do público, entre as concorrentes ao Oscar 2020 em sua categoria. Na trama somos apresentados a Jesper (Jason Schwartzman), um filhinho de papai que vive na vida boa e que não quer nada com nada. Isso até o momento em que seu próprio pai, um grande empresário de uma agência postal localizada em alguma região gelada próxima ao Círculo Polar Ártico, lhe dá um ultimato: ou ele se interessa em trabalhar e a conquistar as coisas pelo seu próprio esforço, ou será deserdado. Em resumo: o pai não é adepto da meritocracia e quer que o piá aprenda o valor das coisas (e só esse começo, já dá uma bonificação em pontos à obra).
Bom, ele manda o próprio filho pro famoso c* do mundo: um povoado distante de tudo, uma ilha isolada e melancólica chamada Smeerensburg, onde ele deverá ser carteiro, com meta de cartas e tudo. A chegada ao local já é tenebrosa, com as habitações e o ambiente como um todo surgindo num espectro fantasmagoricamente abandonado, de cidade isolada - o e desenho de produção nessa parte é não menos do que fabuloso. Pior ainda: no local os moradores não são nada amistosos, com os dois clãs - os Ellingboe e os Krum -, vivendo em pé de guerra. Nesse cenário inóspito, nada acolhedor, Jesper tentará iniciar o seu ofício, sem muito sucesso. A situação se modificará um pouco quando ele descobrir, em uma ponta da ilha, um misterioso carpinteiro de nome Klaus (J. K. Simmons). Em sua casa, uma grande coleção de brinquedos de madeira será a chave para que as primeiras cartas apareçam, em uma das sequências mais desconcertantes e comoventes do ano.
Falando assim, talvez não seja possível dar a dimensão da forma como o filme transcorre. Tudo aquilo que envolve a "existência" do Papai Noel - o por quê de suas roupas, os motivos de entregar os presentes à noite, como surge o trenó (ou a famosa risada) em sua vida -, vai se descortinando em nossa frente de forma orgânica, fluída, sem pressa. Aliás, esse Klaus que inicialmente surge como uma figura misteriosa, introspectiva, aos poucos vai dando lugar a um sujeito afável, de bom coração (a despeito de sua enorme estrutura física). Não demora para que os habitantes, cheios de rivalidades e mesquinharias, sejam contaminados pelas crianças, que estão encantadas com os brinquedos. A cidade fica mais bonita, ganha mais cor, mais vida (num belo trabalho de fotografia e de iluminação, diga-se), as brigas começam a escassear e... bom, não seria um filme se não houvesse um arco dramático para complicar tudo - e ele surge no formato de moradores mais antigos, conservadores, antiquados, que estão, vejam só, insatisfeitos com tudo aquilo.
Com um traço de desenho meio cartunesco (que lembra alguns filmes noventistas da Disney, em 2D), Klaus nos faz rir e chorar ao mesmo tempo em que traz importantes lições de moral sobre amizade, busca da felicidade e prazer nas coisas simples da vida. A jornada de Jesper pode até ser previsível - sai de postulante a playboyzinho para um sujeito que aprende a encarar as dificuldades da vida, com o apoio dos amigos e com superação de diferenças. E assistir a uma obra tão delicada em um mundo tão duro como o que vivemos, é algo para lavar a alma. Sim, a gente sabe que não vai ganhar o Oscar. Mas o "Oscar" desse filme tem sido a resposta do público, que não termina mais de se maravilhar. Especialmente com a solução encontrada para um dos maiores mistérios de Natal - o que assistimos na última sequência da película. É magistral.
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