quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Cine Baú - Casablanca (Casablanca)

De: Michael Curtiz. Com Humphrey Bogart, Ingrid Bergman, Paul Henreid, Claude Rains e Dooley Wilson. Drama / Romance, EUA, 1942, 102 minutos.

Acho que já podemos deixar uma coisa combinada na abertura dessa resenha: em matéria de cinema, a palavra "clássico", no dicionário, bem que poderia (ou deveria) vir acompanhada de uma foto de Casablanca (Casablanca). Afinal, o filme de Michael Curtiz é o CLÁSSICO por excelência. Com todas as letras! Pra começar, trata-se de uma grandiosa história de amor, em meio a um contexto de guerra. Aliás, a ousadia de falar sobre a perseguição promovida pela Alemanha nazista em meio aos anos em que se desenrolava o conflito, também merece crédito. Há ainda um inesquecível "casal" de estrelas de Hollywood - no caso Ingrid Bergman e Humphrey Bogart. Há o roteiro engenhoso, sinuoso, pontuado pelos diálogos tão envolventes quanto cínicos. Por fim existe ainda a riqueza técnica, que vai da construção do cenário que reproduz a cidade que fica ao Norte do Marrocos, até chegar aos jogos de luzes, passando ainda pelo uso da música e pela edição de uma fluidez comovente. Tudo é engenhosamente perfeito. 

Tão perfeito que Casablanca, quase oitenta anos após seu lançamento, segue sendo uma prazerosa experiência fílmica. Que nos joga para dentro do fervilhante Rick's - o caleidoscópico bar/cassino de propriedade de Rick Blaine (Bogart) -, para nos apresentar um sem fim de figuras que trafegam naturalmente pela boemia, de garçons e músicos passando por jogadores vigaristas e empresários sem muitos escrúpulos. No ambiente que é preenchido pela música quase onipresente, a câmera flana de um lado para o outro, o que nos revelará um outro lado desse contexto, que é quebrado pela guerra que se impõe. Casablanca, a cidade, é uma espécie de rota quase obrigatória para quem pretende fugir da América para a Europa, fazendo uma ponte entre Marselha, no Sul da França, e Lisboa, em Portugal. E, portanto, o município marroquino também é povoado por generais, capitães e outros líderes do conflito que movimentam peças de xadrez, enquanto os oprimidos confabulam pelas frestas em busca do sonho de liberdade.

Um desses sujeitos que pretende empreender uma fuga é um certo Victor Laszlo (Paul Henreid), líder da resistência tcheca que chega ao bar acompanhado da estonteante Ilsa Lund (Bergman). Uma troca de olhares entre Ilsa e Rick é o suficiente para que saibamos: há algo a mais entre os dois do que o mero flerte descompromissado. Enquanto Laszlo se ocupa em tentar obter os salvos-condutos que, aparentemente, estão perdidos após o trapaceiro Ugarte (o ótimo Peter Lorre) ser preso, Ilsa e Rick apelam a melodramáticas reminiscências ao som da inesquecível As Times Goes By, tocada majestosamente pelo pianista Sam (Dooley Wilson). Em meio a tudo, o terrível major Strasser (Conrad Veidt) estuda a melhor estratégia para executar seus planos em território não ocupado, enquanto o capitão Renault (Claude Rains) se comporta de forma ambígua, tentando estabelecer limites em meio a todas as forças que se interpõem - enquanto escancara o amor oblíquo que parece verter de seu coração, a cada nova paixão que se apresenta.

É um filme tão completo que é costuma ser lembrado pelos mais variados motivos. Entre elas há as frases memoráveis - "estou de olho em você, garota", "nós sempre teremos, Paris", "Louis, acho que este é o começo de uma bela amizade", "reúna os suspeitos de sempre", "toque novamente, Sam" - e, não por acaso, em uma lista com as maiores citações da história do cinema elaborada pela AFI, Casablanca aparece com seis. Há também uma reviravolta impactante, que torna o final paradoxalmente feliz - teria Rick tomado a atitude correta, nos instantes decisivos do filme? Os figurinos charmosos, os jogos de luzes - repare no brilho ofuscante de Ilsa, quando da cena em que ela chega de volta ao bar, na madrugada -, o romantismo quase kitsch, que se repetiria tantas vezes depois (até mesmo em paródias). O filme de Michael Curtiz é tão maravilhoso, que a premiação máxima no Oscar chega quase a ser pouco. A obra integra o cânone das grandes, aparecendo em absolutamente todas as listas de melhores de todos os tempos - na da AFI é a segunda colocada. E pode ser a porta de entrada ideal para quem quer mergulhar no universo dos "filmes em preto e branco". E dele não sair mais.

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