Aliás, as canções que parecem saídas do folclore regionalista norte americano do começo do século passado acabam por fazer um amálgama quase involuntário à jornada dos anti-heróis que acompanhamos. Após escaparem da lavoura de algodão em que pesadamente trabalhavam - e ali a música, com todo o seu simbolismo de resistência já ecoa -, eles encontram em uma encruzilhada o talentoso violeiro Tommy Johnson (Chris Thomas King) que está indo para uma estação de rádio que está aceitando cantores de bluegrass e country que possam, simbolicamente (e talvez até nostalgicamente) trazer algum conforto para os lares americanos daqueles tempos. É nesse momento que Everett (Clooney), Pete (Turturro) e Delmar (Nelson) se juntam ao sujeito para formar o improvisado Soggy Bottom Boys, entoando pela primeira vez a efervescente e rural I Am a Man Of Constant Sorrow, o que lhes rende alguns dólares, lhes permitindo prosseguir em sua jornada.
Enquanto fogem das autoridades que fazem o diabo para tentar capturá-los, os Bottom Boys e sua música explodem no rádio sem que eles saibam. Aliás, nem o dono da rádio sabe quem são, já que ele é cego. Em meio a conflitos políticos com engravatados que começam a perceber o poder da mídia, Everett, Pete e Delmar se verão diante de uma série de confusões, como a fuga alucinada de um celeiro queimado e encontro aleatório com um grupo de supremacistas brancos da Ku Klux Klan, que pretende assassinar Tommy pelo simples fato de ele ser negro. Há ainda um atormentado encontro com sereias a beira de um rio - o que faz com que o folclore saia das canções para chegar, efetivamente, a história -, com tudo saindo meio errado e Pete sendo transformado em um sapo (!). Só que na maioria desses instantes desse road movie meio torto a música, intepretada por artistas variados como os Stanley Brothers, Harry McClintock e The Whites está lá, trazendo algum conforto, abraçando as personagens e nos fazendo, junto com eles, seguir adiante.
De uma forma meio curiosa, essas músicas de sulista norte-americano - aquele country cheio de letras festivas e mundanas - fizeram enorme sucesso, tornando o disco amplamente vendido. Talvez tenha a ver com a nostalgia do sonho americano, ou mesmo como uma forma de recuperar a autoestima no pós 11 de setembro - por mais que o filme tenha entrado em cartaz antes disso -, mas o caso é que a trilha foi bem recebida pelo público, ainda que tenha sido completamente esnobada na edição do Oscar de 2001. Isso não apaga o efeito causado e, a meu ver, a cena final, com o supremacista Homer (Wayne Duvall) caindo em desgraça política TAMBÉM por causa da música, é uma pequena forma de lavar a alma, com o trio de protagonistas sendo redimido pelo governador, que também está encantado com o potencial musical dos Soggy Bottom Boys. Ode a música e elogio ao potencial das artes inclusive do ponto de vista da influência polítca, social e cultural: é isso que essa pequena obra dos Irmãos Coen faz. É divertido, inteligente, subversivo. Do jeito que gostamos.
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