Todos nós sabemos que relacionamento não é uma ciência exata, afinal de contas são muitas as variáveis para que as coisas possam sair a contento. E, bom, filmes dispostos a discutir essas temáticas existem a rodo - especialmente no nicho do "melodrama de adolescente problemático que precisa superar traumas antes de encarar, de fato, a vida adulta". Mas sabe que A Química Que Há Entre Nós (Chemical Hearts) funciona direitinho? Inclusive eu me identifiquei com as personagens, mesmo já fazendo umas duas dezenas de anos que eu não estou mais na adolescência. A trama segue o padrão da história do garoto introspectivo, não necessariamente antissocial, mas que tem dificuldades de se relacionar com o sexo oposto - ou, vá lá, se apaixonar. E a oportunidade para que as coisas mudem de figura acontece quando o jovem consegue uma vaga de editor do jornalzinho do Ensino Médio, ocasião em que ele conhecerá uma moça tão fechada (e misteriosa) quanto ele.
Sim, eu sei que vocês já devem estar com ranço só de ter lido essa premissa, porque a quantidade de filmes aborrecentes - com jovens da classe média empilhando dramas -, parece não ter fim. Mas esse aqui, ao menos aparentemente, não ataca tanto a nossa inteligência. Ele é um pouco mais realista no retrato dessa etapa da vida que todos nós passamos, com todas as inseguranças de quem ainda não sabe como será a vida adulta, ao mesmo tempo em que abandona a inocência da infância. Aliás, a obra do jovem diretor Richard Tanne se apropria de alguns aspectos da ciência para identificar aquele período da vida - que talvez vá dos, sei lá, 14 aos 20 anos - como uma espécie de limbo juvenil existencial. "Quando você é adolescente, as substâncias do seu cérebro fazem você tomar decisões que o afastam da segurança da infância e o arrastam para a loucura da vida adulta. Alguém disse certa vez que um adulto é uma criança sortuda que sobreviveu ao limbo da adolescência e da melancolia da juventude", filosofa em certa altura o protagonista Henry Page (Austin Abrams).
Henry é o jovem reflexivo (e bastante romântico), que se apaixona pela misteriosa Grace (Lili Reinhart), que será sua colega de jornal. Se vendo todos os dias eles se aproximarão de uma forma meio torta, o que fará vir à tona uma série de feridas relativas ao passado, que tornarão o relacionamento como uma equação um pouco mais difícil de resolver. Pode parecer bobo e previsível, mas as surpresas da história são entregues em doses homeopáticas, o que nos permite digerir melhor as informações. Fora o fato de que tudo é construído utilizando com inteligência as convenções do gênero ou mesmo as metáforas. Há, por exemplo, a citação a um poema de Pablo Neruda sobre amar alguém não apenas por suas qualidades, mas também por seus defeitos. Também há o curioso hobby de Henry, que reforma vasos quebrados, pintando-os depois, dando a eles uma nova cara, um novo sentido. São fatos cotidianos que dialogam com o tipo de relacionamento que assistimos em tela: meio quebrado, que persiste, que luta para "juntar seus cacos", teimando em amar como num poema do escritor chileno.
E há ainda a completa quebra dos clichês do gênero - e são várias. Começa pelos pais de Henry, um casal amável, amoroso, dedicado (e que se ama também). A irmã do jovem lhe ajuda, jamais se apresentando como o contraponto vilanesco. O protagonista tem amigos, não é um sujeito solitário. Só que gosta de escrever, aprecia as artes, é mais "inábil" socialmente. Se ele será feliz? Se Grace será feliz? Talvez sim. Talvez não. Sofrerão, recolherão cacos, tentarão de novo. Como qualquer pessoa, afinal. O cinema costuma nos brindar com fantásticas histórias de amor que servem para nos renovar as esperanças, para nos fazer sorrir, sonhar. Esse aqui funciona mais como um tapão (metafórico) dado na cara, que é pra te fazer lembrar que, sim, com 17 anos você vai sofrer. Vai sofrer pra caramba. E ainda mais um pouco. E vai ter pensamentos ruins e apertos no peito e ansiedade. Mas as coisas vão passar. E se iluminar, provavelmente. Mesmo que demore. O filme faz essa construção de contexto de forma belíssima. E ainda tem uma trilha sonora - de nomes como The xx, Perfume Genius e Beach House - que é a cereja do bolo. Eu, se fosse você, daria uma chance. Vale a pena.
Nota: 8,0
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