terça-feira, 21 de setembro de 2021

Cinema - Cry Macho: O Caminho Para a Redenção (Cry Macho)

De: Clint Eastwood. Com Clint Eastwood, Eduardo Minett, Dwight Yoakam, Natalia Traven e Fernanda Urrejola. Drama, EUA, 2021, 104 minutos.

Vamos combinar: toda vez que sai um novo filme dirigido e atuado pelo Clint Eastwood ficamos nos imaginando se este vai ser o seu aceno final rumo a aposentadoria. Difícil saber. Aos 91 anos o veterano ainda parece encontrar prazer não apenas em estar atrás das câmeras, mas também em se desafiar em frente a elas. Sim, não há mais o vigor de outrora. E a a figura máscula e decidida vista em seus grandes clássicos - especialmente os faroestes - deu lugar, definitivamente, ao senhorzinho de olhos cansados, que olha para o passado com nostalgia e um certo saudosismo. E aí o que acontece em suas mais recentes obras parece ser um clima de "tributo constante". E quem analisa cinema também acaba envolvido por essa atmosfera. Não esperamos mais a virilidade e a força daqueles tempos distantes. O que entra no lugar agora é a sabedoria. A experiência a ser repassada. O caráter contemplativo, quase existencial da vida como um projeto em que a missão foi cumprida. E tudo com a certeza, talvez paradoxalmente melancólica, de que o ocaso se aproxima. De que o fim está no horizonte.

E talvez por isso a informação que se tem é a de que a equipe de filmagem teria se emocionado ao ver o nonagenário Clint em cima de um um cavalo - sequência de Cry Macho: O Caminho Para a Redenção (Cry Macho) que ele se desafiou fazer. O mesmo valendo para o instante em que ele esmurra a cara de um bandido que pretende "sequestrar" o seu protegido. O que está em jogo em um filme do tipo é a proteção ao legado. Que vem acompanhado de uma pré-disposição nossa para passar pano para os eventuais equívocos narrativos, com um roteiro que ocorre sem maiores complexidades, com desafios mínimos (e em muitos casos não muito bem explicados). É uma forma de homenagear os esforços daquele que poderia estar na beira da praia, curtindo a família e cuidando da saúde, mas que prefere entregar aquilo que mais ama, no caso a sua arte, para o público que lhe acompanha de forma quase ardorosa.

Nesse sentido parece meio estranho dizer que o roteiro do filme - baseado na novela de Richard Nash - seja o de menos. Só que é difícil analisar uma obra dessas sem dosar as paixões. É como aquele grande jogador de futebol que já foi ídolo de nosso clube e que agora, próximo de pendurar as chuteiras, padece das dores da idade, das dificuldades decorrentes do esforço agora sem resposta. Clint fez tanto pelo cinema que o filmezinho água com açúcar à moda de um "faroeste da Sessão da Tarde" serve para que nos sintamos magnetizados pela sua inebriante presença. Mesmo que com ombros agora arqueados. Mesmo que com movimentos muito mais vagarosos. E com muitas cenas em que ele anuncia para o jovem Rafa (Eduardo Minett) - o qual ele está empenhado em trazer do México para a casa do seu pai, no Texas - que está indo dormir. Miko, o personagem de Eastwood, não esconde, afinal, que está exausto. Que está velho. Não tenta ser o que não é. E talvez seja isso que nos comova. Esse olhar para a realidade que sempre chega. Com a idade, com o peso, com a saudade.

Os obstáculos de Miko e Rafa pelo caminho pouco importam. Em meio as paisagens desérticas do Sul do Texas e do norte do México, o que ficam são as lições de vida. As últimas danças inesperadas. As amizades que surgem de improviso. No road movie que acompanhamos, muito mais do que um tiro bem dado ou um soco bem desferido o que ganha valor é a palavra bem aplicada. É a generosidade transmitida, como no instante em que Miko descreve o absurdo da persistência do "macho" como um valor - o que em uma sociedade tão machista e tão misógina não é pouco. Eastwood não vai ganhar o Oscar por esse papel. Aliás, provavelmente não será sequer indicado. Mas o filme tem belas ambientações, uma fotografia granulada que faz ressaltar o caráter "desértico" daquilo que acompanhamos. E que ainda apresenta um outro lado do México - o que na era pós-Trump não deixa de ser um aceno para o absurdo da xenofobia. Talvez seja insuficiente para muitos. Talvez o público esperasse mais. Mas no finalzinho do feriado essa obra nos abraçou. Nos fez refletir. Sobre tempo, sobre memória, sobre idade. Sobre vida e sobre morte. E isso, pra mim, é também uma experiência arrebatadora de cinema.

Nota: 8,0

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