segunda-feira, 31 de março de 2025

Novidades em Streaming - A Última Showgirl (The Last Showgirl)

De: Gia Coppola. Com Pamela Anderson, Jamie Lee Curtis, Dave Bautista e Brenda Song. Drama, EUA, 2024, 89 minutos.

Juro que eu não queria ter pensado nisso neste filme em específico, mas aconteceu: estou com receio de que possamos viver uma banalização, uma saturação do comeback, do jeito que a coisa vai. Sim, é justíssimo que muitos artistas sejam resgatados, recuperados e que tenham direito ao holofote que parece já perdido há algum tempo - ainda mais no caso de figuras emblemáticas do passado, como é o caso da Pamela Anderson, uma das eternas salva-vidas de Baywatch -, que dão a impressão de só terem tido valor para a indústria enquanto eram jovens e bonitas. Como disse, as novas oportunidades que possam fornecer grau um maior de profundidade dramática para aqueles que só eram conhecidos por seus corpos esculturais, parece uma forma legítima de emparelhar essa conta. E fazer com que atores e, especialmente, atrizes tenham novas chances. Ainda mais no caso de Anderson, que passou poucas e boas na sua carreira.

Mas a meu ver é aí que parece residir uma parte do problema: o retorno não pode ser apenas pelo retorno. Em uma obra que só não se esvai no completo nada porque tem o seu pontinho bem demarcado sobre o problema do etarismo e de como opera a máquina trituradora de estrelas - sempre sedenta pela novidade da vez, pela jovem em ascensão, pelo nome mais sexy do momento e que vai estampar as capas de revistas por um punhado de anos -, temos quase uma sensação de vazio. Pamela Anderson já foi essa pessoa nos anos 90. Já foi uma deusa desejada por dez entre dez seres humanos na face da Terra. E, assim como ocorreu com Demi Moore no último ano, foi buscada de algum tipo de limbo das divindades de Hollywood, anos após ter sex tape roubada e distribuída sem autorização e de ter sofrido outros abusos e humilhações do meio. Só que tem uma diferença: A Substância (2024) é um filmaço. Já A Última Showgirl (The Last Showgirl) é uma experiência meio oca que, com o perdão do trocadilho, parece justamente carecer de substância.

 


 

Em linhas gerais, o terceiro filme de Gia Coppola - neta de Francis e sobrinha de Sofia -, até tem algum tipo de esforço estilo Sundance wannabe, que nos faz lembrar algum tipo de meme imaginário em que a diretora aparece pensativa diante de uma ilha de edição, com a mão no queixo dizendo "isso aqui os cinéfilos vão gostar". Ao cabo há toda uma aura onírica de poeira e de purpurina que parece ideal para os arenosos arredores de Las Vegas - e talvez não seja por acaso que Shelly (Anderson) apareça tantas vezes em planos médios como alguém que apenas olha para o horizonte, num misto de melancolia e letargia, enquanto a ótima trilha sonora de Andrew Wyatt nos invade a alma com suas notas cortantes e nebulosas. Esse clima meio de decadência do sonho americano faz lembrar as obras de Sean Baker, como se aqui tivéssemos uma improvisada mistura de Projeto Florida (2017) com Red Rocket (2021).

Nessa altura do campeonato você já sabe que a Última Showgirl é justamente a última dança - pra utilizar um outro trocadilho, esse muito recorrente no meio esportivo -, de uma dançarina que se aproxima dos 60 anos e que é informada por Eddie (Dave Bautista no modo capilar, aliás, de onde surgiu tanto cabelo naquela cabeça?), o produtor da famosa casa de shows Razzle Dazzle, que a boate vai fechar. Os tempos mudaram e o auge vivido nos anos 80 e 90 ficou para trás. Para Shelly e para outras dançarinas, como as jovens Mary-Anne (Brenda Song) e Jodie (Kiernan Shipka) o futuro parece incerto. A protagonista tem uma melhor amiga chamada Annette (Jamie Lee Curtis, uma espécie de estranho alívio cômico) que saiu do cabaré anos antes e hoje ganha a vida como garçonete em um cassino. E, como não poderia deixar de ser nesse gênero dentro do gênero, há ainda o subtexto da mãe marginalizada que tenta se reaproximar da filha - algo que já tínhamos experienciado no péssimo A Baleia (2022), mais um caso de comeback que o pessoal se emocionou um pouquinho a mais da conta, em um filme bem ruim.

 

 

Como já meio que dito, aqui temos o filme que promete e que fica só na promessa. Há um sentimento geral de baixa profundidade na coisa toda, que quase descamba pro moralismo barato, especialmente quando a filha - seu nome é Hannah (Billie Lord) - retorna para confrontar a mãe a respeito de suas escolhas do passado (especialmente o fato de ter priorizado a sua arte para colocar comida no prato daqueles que ama). Outro ponto meio incômodo é a suposta insistência de que a protagonista só terá algum futuro se tiver um homem pra chamar de seu. Ou se tiver um trabalho garantido para quando a aposentadoria dos palcos vier. A impressão que temos é a de que as pessoas se resumem só a isso - trabalho, marido, vidinha. A esse entorno. E essa falta de complexidade não se resolve com Shelly dançando desvairadamente nas ruas, ao som de uma trilha sonora metafísica. Ou com uma cena meio patética de Curtis dançando da forma mais cringe do planeta ao som de Total Eclipse of the Heart. Talvez haja outras formas de contar essas histórias. Com mais solidez. Senão o comeback fica meio injustificado. E até meio constrangedor.

Nota: 5,0

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