De: Emmanuel Mouret. Com India Hair, Camille Cottin, Sara Forestier e Damien Bonnard. Comédia / Romance, França, 2024, 117 minutos.
[ATENÇÃO: TEXTO COM ALGUNS SPOILERS]
"E se meu coração não tivesse mudado?".
Vamos combinar que não há nenhuma grande novidade no que diz respeito à análise das complexidades que envolvem as paixões, em Três Irmãs (Trois Amies). Sim, amar não é uma ciência exata, cartesiana e muitos filmes já trataram disso com maestria. Só que essa obra aqui tem carisma de sobra pra segurar o espectador, ou pra nos envolver em alguma medida. Ao cabo há um charme meio torto no todo - especialmente quando descobrimos o segredo eventualmente machadiano, que envolve o narrador da história. Sim, o filme é sobre três amigas e suas andanças, mas o ponto de ligação de tudo é o professor Victor (Vincent Macaigne), que está devastado após a sua amada Joan (India Hair) revelar a ele que não o ama mais. Simplesmente meio que acabou a paixão e ela não sabe muito bem como lidar. Victor é carinhoso, devoto, verbaliza o quanto gosta dela, da família que construíram, da convivência. Mas não basta.
E, muito provavelmente, vocês que leem essas poucas linhas já sabem disso: não há lógica. Se houvesse uma espécie de equipamento de medida do quão apaixonados estamos por nossos pares, ele certamente variaria de um dia para o outro, de uma semana para a outra. Se alteraria com a passagem do tempo, a chegada dos filhos, a rotina. Somos seres de personalidade labiríntica, que respondem a estímulos variados no cotidiano. Joan, que leciona na mesma escola de Victor, garante à amiga Alice (Camille Cottin) que ela não deixou de gostar do marido. Ela tem apreço por ele. Que parece, de fato, alguém generoso, carinhoso. Mas como a gente lida quando aquele brilho, ou aquela admiração parece nos escapar? Lida, sei lá, vivendo talvez. Joan revela ao marido os seus dilemas e uma tragédia acaba ocorrendo, com ela se culpando. Uma sensação que só começa a se dissipar com a presença do docente que justamente substitui seu ex no educandário - seu nome é Thomas (Damien Bonnard).
Aliás, não demora para que percebamos que Thomas está caidinho de paixões por Joan - ele a apoia em seu luto e respeita o seu tempo de depuração. Ela não parece estar interessada em um relacionamento agora. Quer dizer, ao menos até o surgimento de Martin (Mathieu Metral), um colega de Thomas que surge para dividir o apartamento com ele. Mais impetuoso do que o companheiro, Martin tem a ousadia de se aproximar de Joan que cede. Aquela coisa de não estar preparada pra um novo relacionamento, cai por terra. E a gente sabe: esse papo só cola porque a pessoa "certa" ainda não pintou. E até aqui você já percebeu que a narrativa parece percorrer uma lógica que lembra o poema Quadrilha, de Carlos Drummond de Andrade (aquele do João que amava Teresa, que amava Raimundo e por aí vai). E é mais ou menos isso que vai se descortinando, com cada qual respondendo de forma nem sempre esperada.
Sobre Alice, bom lembrar que ela parece ter um relacionamento perfeito adequado (não exatamente fervoroso) com Éric (Gregoire Ludig). Mas as aparências enganam, já que o sujeito está, justamente, tendo um caso com a terceira amiga desse triângulo nada óbvio - seu nome é Rebecca (Sara Forestier). Sem que a amiga saiba, claro. Para os mais puristas ou conservadores, a naturalidade com que as traições, as trocas de casais e as mentiras acontecem podem incomodar. Ninguém é muito afeito a monogamia ali e, de certa forma, isso também pode evidenciar, do ponto de vista alegórico, o quão perdidos parecem os millenials, em meio a filhos que já cresceram (ou não existem), relacionamento mais longos que começam a se despedaçar sem muita explicação ou as exigências do mercado que também nos consomem. É um filme interessante, agridoce e leve.
Nota: 7,5
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