De: Paul Thomas Anderson. Leonardo DiCaprio, Teyana Taylor, Sean Penn, Chase Infiniti e Benicio Del Toro. Ação / Policial / Comédia / Drama, EUA, 2025, 161 minutos.
Existe uma frase atribuída à Che Guevara que diz que "a revolução se faz através do homem, mas o homem tem de forjar, dia a dia, o seu espírito revolucionário". Em alguma medida e, em uma interpretação bastante livre, é possível afirmar que tal sentença resume bem o sentimento vivido por Pat Calhoun (Leonardo DiCaprio), personagem central de Uma Batalha Após a Outra (One Battle After Another), que está em cartaz nas cinemas do País. Ao cabo, a obra dirigida por Paul Thomas Anderson - um dos favoritos da casa - é uma experiência larga, grandiosa, que alterna momentos frenéticos de perseguição e de fugas espetaculares (tanto a pé, como em carros em movimento), com instantes um tanto intimistas, domésticos e reflexivos. Não apenas sobre os tempos em que vivemos - de ascensão de uma extrema direita a cada dia mais radical -, mas também da persistência quase romântica em não deixar os ideais revolucionários esmorecerem.
Porque em geral é muito cômodo aceitar o mundo em que vivemos. Com Bolsonaro, Trump, Netanyahu, supremacismo branco, nazismo da pós-modernidade, xenofobia, genocídios e instabilidade social generalizada. Mas como é possível acordar todas as manhãs, recolhendo todo o ânimo restante para que o ideal de um mundo melhor para as gerações futuras se perpetue? Como ir para além da paixão sanguínea e ideológica que move os movimentos de esquerda (ou progressistas) que lutam por justiça social e um maior equilíbrio entre quem está acima e abaixo da pirâmide? No primeiro terço da produção é meio que impossível não se comover com uma espécie de deleite amorosamente revolucionário. Aquela coisa de tesão e fúria, de sexo e bomba, de luta panfletária por liberdades em meio a tiros, gozo e tentativas espetaculares de driblar as forças militares que se instauram nas entranhas do poder. E que acham que podem determinar o futuro do cidadão comum, levando-se em conta sua raça, gênero ou cor da pele.
Pat e a parceira de crimes (e de cama) Perfídia Berverly Hills (a ótima Teyana Taylor) - como se fossem uma espécie de Bonnie and Clyde das trincheiras revolucionárias -, integram o coletivo French 75 que realiza, por baixo dos panos, uma série de ações que envolvem explosões com bombas, resgates mirabolantes de presos políticos, e ataques a rede elétrica, que visam a desestabilizar o governo tirânico e autoritário de extrema direita em vigor. E que tem no comandante Steven Lockjaw (Sean Penn, como se fosse um General Heleno do universo nem tão alternativo), o seu principal rosto. Aliás, rosto asqueroso como costuma ser o desses neofascistas que compensam algum tipo de ausência, com muito grito, muita arma empunhada, um tanto de cara feia e muita raiva de qualquer minoria. Negros, gays, imigrantes, quem quer que seja. E é por isso que ele fica absolutamente exasperado quando ele é humilhado por Perfídia, durante uma ação do grupo. Para mais tarde capturá-la, obrigando-a a fazer sexo com ele.
Perfídia, mais adiante, dá à luz à filha Charlene (Chase Infiniti), mas, incapaz de seguir uma vidinha de "bela, recatada e do lar", ela foge de casa para seguir os ideais da revolução, deixando a cargo de Pat a criação da pequena. Só que, em uma das ações do French 75 as coisas saem errado, Perfídia é presa, indo parar em uma espécie de Programa de Proteção de Testemunhas, que é conduzido pelo próprio Lockjaw, com seus trejeitos e tiques nervosos absurdamente irritantes. Um conjunto de situações que obrigará Pat e Charlene a fugirem, enquanto Perfídia também consegue escapar do seu asilo forçado - no caso, para o México. Um salto de 16 anos no tempo mostrará pai e filha vivendo agora com outra identidade (seus novos nomes são Bob e Willa), tentando tocar a vida em uma cidade santuário isolada. E, claro, como não poderia deixar de ser, a caçada em si ainda não terminou, especialmente após Lockjaw se tornar integrante de luxo de um grupo supremacista - o que faz com que Bob / Pat se torne a cada dia mais paranoico. Tendo no vício em drogas uma espécie de válvula de escape.
Com uma trilha sonora envolvente, de cordas e pianos cortantes que sobem e diminuem, mas que permanecem meio que o tempo todo - cortesia de Jonny Greenwood, do Radiohead -, e uma edição ágil, mas nunca confusa, Uma Batalha Após a Outra é uma aventura política quente, inspirada em um conto de Thomas Pynchon, e que dialoga, inevitavelmente, com o atual contexto político (ainda que Vineland, o texto de Pynchon, tenha sido escrito na esteira do governo do republicano Ronald Reagan). Por vezes exagerado, em outros momentos engraçado, mas o tempo todo hipnótico, esse é o tipo de produção que, as pessoas elogiam dizendo que "nem se vê às 2h40 passarem". Sim, isso pode ser um mérito, especialmente em uma obra bem costurada, ágil e que mantém a atenção do público. Claro que, no terço final, quando a perseguição parece não ter mais fim - depois da entrada em cena do professor de caratê de Willa, Sergio (Benicio Del Toro) -, a coisa pode dar uma certa cansada. Ainda mais quando meio que já compreendemos a mensagem que fica, no que diz respeito ao combate permanente de regimes autoritários. E da importância de nunca desmobilizar.
Nota: 9,0
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