segunda-feira, 28 de julho de 2025

Novidades em Streaming - Tóxico (Akiplėša)

De: Saulė Bliuvaitė. Com Vesta Matulytė, Ieva Rupeikaitė e Giedrius Savickas. Drama, Lituânia, 2024, 99 minutos.

Está lá no dicionário: tóxico é tudo aquilo que produz efeitos nocivos no organismo. E, nesse sentido, é preciso saudar a escolha do título do longa de estreia da diretora Saulė Bliuvaitė, que acaba de estrear na Mubi. Existe uma cena perturbadora no filme, em que a jovem Kristina (Ieva Rupeikaitė) pesquisa na internet sobre ovos de tênia. Tênia, aquela da solitária. Eu, do alto da minha ingenuidade, cheguei a achar que a busca na web envolvia algum trabalho de aula, para alguma matéria de Biologia. É só mais tarde, quando um amigo da adolescente lhe entrega o que seriam pílulas com ovos do parasita - adquiridas, como não poderia deixar de ser, na darkweb -, que compreendo o propósito daquilo. Para tentar uma vida melhor, Kristina, do alto dos seus 13 anos, esté empenhada em uma futura carreira de modelo. Um ambiente de sonho e de muitas exigências. Inclusive tóxicas, de agressão ao próprio corpo.

Drama tenso e pungente, que quase vai ao limite do terror Tóxico (Akiplėša), o vencedor do Leopoardo de Ouro, em Locarno, é, curiosamente, mais um filme a abordar esse desejo íntimo de fama e de sucesso, que permita à meninas nascidas em ambientes pobres ou vulneráveis, um futuro mais promissor. Assim como no recente e perturbador Diamante Bruto (2024) - sobre uma jovem adulta determinada a emplacar a sua presença em um reality show de gosto duvidoso, apenas para aumentar o número de seguidores no Instagram, que lhe permitam uma maior conversão em vendas ou melhores publis -, aqui também as garotas parecem iludidas por adultos cheios de promessas, o que envolve um comportamento abnegado e totalmente distante do que seria a existência de meninas que mal entraram na puberdade. Nesse sentido, não deixa de ser curioso ver Kristina alternando sequências em que surge (supostamente) confiante, de maiô e salto alto, com outras em que, ainda como uma criança, penteia os cabelos de uma Barbie.

 


Esse limite entre a infantilidade e a maturidade obrigatoriamente antecipada também gera no espectador um sentimento meio que de repulsa. Saber que um ambiente tão misógino e de tanta cobrança como o das supermodelos siga sendo alvo para muitas meninas - algumas delas, inclusive, estimuladas por pais narcisistas - é algo que é parte do incômodo. O que torna a experiência bastante efetiva. Mas para além deste ser um projeto sobre os bastidores de agências de modelos ou de desfiles improvisados em cenários modestos, esta também é uma obra sobre amizade. E sobre crescer nesse mundo brutalizado. No começo do filme, vemos um vestiário feminino desses típicos de escolinha de natação, em que Marija (Vesta Matulytė) sofre bullying. Mais alta que as demais, meio desajeitada e antissocial - o que é reforçado por uma deficiência na perna, o que lhe impede de caminhar sem mancar -, ela é uma espécie de novidade no vilarejo em que a trama se passa. Sofre agressões gerais. Até roubada é.

Mas quando começa a frequentar a mesma escola para modelos de Kristina - uma das bullyers -, uma amizade meio que inesperada tem início. Ambas passam a fazer tudo que meio que juntas. E a conviver nesse contexto estranho que lhes leva a passarelas tortas, a amizades cheias de más intenções e a professoras que não hesitam em afirmar que elas só serão escolhidas se mantiverem as suas medidas abaixo de um certo padrão. Não são poucas as vezes que a fita métrica é estendida, para dar a volta nas magricelas cinturas das adolescentes. No desespero em não perder uma das vagas, Kristina apela para os ovos de tênia. A real é que tudo é tóxico naquele contexto. Os ovos, por óbvio; uma vida pobre e de pouca esperança - por mais que pais e avós pareçam empenhados em possibilitar os sonhos juvenis -, e os próprios bastidores dessas agências. O tóxico aqui é literal, mas também alegórico. É concreto e abstrato. E é meio difícil não sair de estômago embrulhado.

Nota: 8,0 

 

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