Um filme como A Lavanderia (The Laundromat) teria tudo para ser verborragicamente chato se fosse um drama. Imagina pegar um tema real como o caso dos Panama Papers que, em 2016, denunciaram um esquema de fraudes milionário e que envolvia empresas de diversos países, para tratá-lo de forma solene e séria? Talvez funcionasse em um bem organizado documentário, mas o que o sempre versátil diretor Steven Soderbergh (Traffic) faz aqui é utilizar um tom de deboche que combina bem com o absurdo da ação de figuras inescrupulosas que, instaladas em escritórios fictícios, criam empresas de fachada que, por meio de evasão fiscal e outras negociatas, ganharão milhões às custas de pessoas comuns. Sim, o filme toma partido, tendo como alvo os próprios Estados Unidos e as suas brechas que permitem, por exemplo, que 60 de suas maiores empresas sejam isentas de pagar qualquer imposto sobre US$ 79 bilhões de renda bruta. BILHÕES!
Bom, um desses escritórios de advocacia fraudulentos era comandado por Ramón Fonseca (Antonio Banderas) e Jürgen Mossack (Gary Oldman), diretamente do Panamá. O filme começa com a dupla conversando diretamente conosco, quebrando a quarta parede, enquanto explicam de forma bastante didática sobre "crédito" e sobre como ele foi criado para que não precisemos mais levar conosco "milhares de tirinhas de papel no bolso", que também podem ser transformadas na grana que vem do futuro. Commodities, empréstimos, ações, títulos, fundos, mercados futuros, derivativos, securitização, chamada de margem e outros termos servem para introduzir o tema e para dizer que o dinheiro - aliás, nunca houve tanto dele! - pode ter outros nomes. O cenário em que ambos trafegam vai da pré-história até chegar a uma galante festa, em um plano sequência de quase cinco minutos, que dará o tom da película. Leve, colorido, sarcástico.
Mas ainda que o assunto seja tratado com leveza, a severidade das ações inescrupulosas dos protagonistas logo serão despejadas na tela quando um acidente de barco que levava um grupo de férias, resulta na morte de 21 pessoas. Impedida de ter uma indenização justa e sem conseguir o apartamento que desejava no acordo que resultou na morte de seu marido, uma mulher de nome Ellen Martin (Meryl Streep, que provavelmente será indicada ao Oscar pelo papel), resolve investigar por conta própria a empresa que está lhe dando o calote. É a partir das ações dela que o filme se desenvolverá em capítulos, que servirão como pequenas esquetes que mostrarão as mais variadas faces dos esquemas. Ás vezes a gente vai achar meio estranho que a obra enverede por um caminho diferente daquele que esperávamos para, mais adiante, retornar para os trilhos. Tudo terá sentido com o fio condutor sendo as tramoias da dupla por trás da empresa Mossack e Fonseca.
Recheada de participações especiais - de Sharon Stone à David Schwimmer, passando por James Cromwell e Will Forte -, o filme flanará com leveza, ainda que aborde o mal-estar da modernidade, que pode ser provocado pela ganância e pela ânsia de obter vantagens financeiras. Brigas familiares, ocultação de informações, chantagens diversas e outros estratagemas surgem com uma naturalidade que não surpreende, quando o assunto é a pretensão da riqueza. Reservando uma pequena surpresa para o final, o filme ganha um tom mais austero em sua reviravolta, com uma de suas figuras centrais personificando a busca por justiça e estabelecendo o debate sobre Reforma Tributária ou Fiscal como mais do que urgente. Sobra até para a brasileira Odebrecht, que é citada por pagamento de propinas para favorecer obras ao redor do mundo. A gente se diverte mas, no final, está rindo mesmo é do absurdo.
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